Fui à procura do cogumelo branco redondão da semana passada. Se estão lembrados dele, era gordo, bojudo, cabeçudo. Para meu espanto, já não existia. Não estranhei: os cogumelos desfazem-se, murcham, secam, esvaziam-se, dissolvem-se na terra. Ou isso ou tinha-se transformado. Agora, em vez dele, um ainda maior mas elegante, pé alto. E uma campânula que parece um disco, talvez uma nave espacial. Por baixo, é filamentado e, à volta, como que rendilhado. Branquíssimo. Muito grande. Como uma casa de gnomos, como uma aparição.
Talvez seja por aqui que anda a fadinha do bosque. Quando o crepúsculo desce sobre o campo, as fadinhas saem dos buraquinhos das rochas e afoitam-se pelos caminhos. Vão com as suas asinhas luminosas, dando saltinhos, brincando ao luar. Depois, quando encontram uma casinha branca, percebem que ali podem ficar à vontade. Talvez, a esta hora esteja encostada ao caule, acolhida da noite e da grande chuva que cai copiosamente, talvez tocando uma harpa invisível. E, na copa da grande azinheira, ocultos pela folhagem escura e molhada, os pássaros escutarão em silêncio a melodia mágica que a fadinha fará sair das cordas da sua misteriosa harpa. Um som maravilhoso, secreto, rente à imaginação.
Mas, voltando à tarde: depois da descoberta do ovni branco, fui pelos campos, passeando. Por todo o lado, há folhas acobreadas por entre a caruma que também está rubra ou sobre folhinhas secas, pauzinhos, ervinhas cujo verde ainda resiste. Pensei: deus existe e vive aqui. Brinca com as folhas, brinca com as cores, brinca com tudo. Gosta da harmonia das composições. E gosta de me surpreender com a beleza das coisas.
Pensei:
Há sempre um deus fantástico nas casas
Em que eu vivo, e em volta dos meus passos
Eu sinto os grandes anjos cujas asas
Contêm todo o vento dos espaços
Depois começou a chuviscar e fui abrigar-me sob o perfumado e belíssimo eucalipto, o maior deles. O som do vento na ramagem faz-me lembrar o mar (já o disse, eu sei). E vem aquele perfume fresco que sempre me fará lembrar um espaço de sombra e sonho pelo qual passava todos os dias, quando era pequena, e a minha mãe me ia deixar a casa da minha avó. Havia eucaliptos e havia um regato pequeno, de água fresquinha. Bebíamos água na concha das nossas mãos. E eu apanhava os chapelinhos dos eucaliptos.
Há sempre um deus por aqui, há sim, escondido nas árvores, nas grutas, nos caminhos. Espalha perfumes, espalha felicidades.
E depois as surpresas. Estava a andar e pensava que as folhas do plátano tinham voado para bem longe dele, estavam por todo o lado. Sou míope e habituei-me a isso, a ter uma ideia, uma impressão -- mais do que a ver. Mas como ando numa de micro-observação, baixo-me, ausculto, inspecciono. E vi. Não. Não eram folhas. Eram cogumelos. Por todo o lado. Por todo o lado. Acreditem: por todo o lado. Como se a terra fervilhasse de vida, como se dela rebentassem mil corpos, mil cores.
Uns pequenos e em grupo, outros isolados, outros grandes, reluzentes na sua textura lisa e carnuda. Uns estão intactos, outros parece que algum animal já andou a banquetear-se, tantas as dentadas. Não vejo por lá animais envenenados pelo que acho que posso concluir que não são venenosos. Mas não lhes toco. São sagrados, fruto da terra, mágicos, nascidos do nada.
Não sei o que significa isto, de haver tantos, tantos cogumelos. É que são em número surpreendente. Tantos. Já o disse antes e repito (mas sou ignorante, é um mero palpite): para mim é sinal de fertilidade da terra pois toda ela me cheira a fecundidade, a vida em estado puro, a beleza intacta.
O vento dos espaços. Ouço o vento. Em volta dos meus passos. Os deuses com as suas grandes asas. Sophia disse-o e eu sinto-o como se fosse eu a sentir.
As cores do Outono in heaven, o som da chuva e do vento, os cheiros da terra e das árvores. O tempo a esculpir e a pintar a natureza. A beleza das coisas, a simplicidade das palavras que falam do que é puro e bom. O silêncio e a música. A harmonia e a paz. O sonho e encantamento.
Que bom poder mergulhar assim na natureza...
ResponderEliminar~CC~
Que belo espaço que aí tem!
ResponderEliminarGostei muito de ler, ver e ouvir; gosto do som da harpa, que acho que deve ser muito difícil de tocar:)
Beijinhos e um bom domingo aí In Heaven:))
Que tesouros do seu heaven on earth.
ResponderEliminarMesmo sendo ignorante nessa área também, parece-me que onde se gera vida há fertilidade, têm aí belos exemplares do Reino Fungi.
Um bom domingo.
Estou como a Isabel, eu gosto é destes "postais" da mãe natureza - dos da natureza humana já estou um bocadinho farta, confesso.
ResponderEliminarQuero lá saber que a coisa do outro não funcione (aliás nem sei quem é), mas enfim sempre pode pedir conselho ao Futre, sei lá...
Fiquei feliz com este: belas palavras e belíssimas fotos.
Carpe Diem!
ma
Que bom deve ser ter um Paraíso para morar, UJM!!
ResponderEliminarNesta altura do ano em que a Natureza se enche de cores quentes e se prepara para descansar, só não absorve a beleza que ela nos concede, quem for muito insensível, ou viver absorvido com outros olhares.
Que bem, mas que bem sabe a UJM escrever!
Escreve com o coração, tudo o que a sua alma sente. E eu, fico aqui sem saber o que dizer, feita tonta. :)
Um abraço, boa semana.