Tive hoje uma reunião tão do outro mundo que saí de lá azamboada. Por todos os motivos e, na verdade, por mais um, não posso aqui falar dela. Mas hei-de assimilar bem o que ali se passou, hei-de processar e, daqui por algum tempo, num qualquer contexto em que não se perceba que tem a ver com o que tem a ver, pode ser que conte uma ou outra pequena coisa. Tudo interessante demais. E, para mim que volta e meia sinto que já vivi muito, que já passei por muito, que já sei muita coisa, foi um daqueles banhos (ou melhor: banhada) em que uma pessoa percebe que passa por esta vida conhecendo apenas uma ínfima partícula da infinita imensidão que há para conhecer. De facto, fui confrontada com um mundo novo que, em absoluto, desconhecia. E, ao ter tido esse vislumbre, parece que passei a ver todo o mundo de uma outra maneira.
Ao almoço, tinha a ideia de ir comprar um cartão para a máquina fotográfica. Mas tão baratinada estava das ideias que não me restou outra solução senão ir à Zara. Ando há uns tempos a pensar que tenho roupa que me chega até ao fim dos meus dias (isto se não desatar a crescer ou a engordar, claro). Mas hoje despensei. Para grandes males, grandes remédios. Mas entrei a querer acreditar que era só para matar saudades, só para ver em que param as modas. Dei uma volta com passada larga,
a olhar ao largo, intimamente a fingir que desdenhava. Mas depois vi um casaco lindo. Espreitei o preço: Não..!, pensei, incrédula. Barato de dar raiva. Determinada, segui. Depois vi blusa-camisa num tecido e numas cores que não dava para acreditar. Espreitei o preço: Não...! Um preço diabólico de tão tentador.
Segui. Mas depois assomou uma dúvida: caneco, mas será que não mereço ser uma consumista parva? E logo concluí que mereço, sim senhora. Voltei atrás, peguei no casaco e na blusa e fui provar. Oh coisa boa, um provador da Zara... Ficava tudo às mil maravilhas. E que não ficasse. Trouxe.
Quando saí da Zara com o saco de papel preto, ocorreu-me uma coisa que me pareceu ser a solução para o novelo sombrio que me tem cercado. Vinha outra. Capaz de levar o mundo à minha frente, a pontapé.
Durante a tarde tive tantas mil porcarias e outras tantas coisas faz de conta que muito importantes que não tive tempo para voltar a pensar no assunto. Quando me meti no carro para voltar a casa já a ideia me parecia trabalhosa demais quando quero é abrandar.
Agora não me apetece pensar no assunto. Não gosto de pensar em cenários. Prefiro esperar que as ideias se formem sozinhas e venham ter comigo.
Então, quando há bocado me sentei aqui, cheia, cheia de sono, em vez de pensar nestas confusões e propostas e pressões que parecem não querer sair de cima de mim, fui pôr-me a ver estantes do Ikea, a fazer contas aos metros lineares de prateleiras, a estudar onde pôr o quê. Devia ter começado a escrever isto mais cedo, deveria pensar na minha vida, deveria aprender a deixar mais espaço para dormir. Mas não. É isto.
E depois, em vez de pensar no que ia escrever ou se amanhã devo dar algum passo, pus-me a olhar para as pilhas de livros que estão em cima da mesa redonda, em cima das estantes baixas, em cima do cadeirão, ao lado do sofá, e a pensar se caberiam nas estantes novas. E como reorganizar a lógica da biblioteca? E já só me apetece tirar tudo, começar a fazer montes no chão, faltar ao trabalho e ir encomendar estantes, depois faltar para ficar em casa a rearrumar numa nova sequência.
Tirando também a vontade de me virar para uma vida nova. Começar uma vida nova. Tudo novo. Já algumas vezes na minha vida começo de novo: tudo novo. Lugares novos. Gente nova. Projectos novos. Um salto no desconhecido. A atracção que tenho por isto ninguém imagina.
E, em simultâneo, uma ideia: arranjar um agente literário. Ainda os livros não estão escritos e já esta estranha vontade de ter um agente. E umas ideias meio tresloucadas associadas a isso. Mesmo sabendo que só daqui por algum tempo e que, se calhar, pelo meio, ainda atravessarei o desconhecido e correrei riscos.
E assim vai passando a noite. E eu nesta improdutividade. E, tendo já escrito tanta palavra, espremendo tudo, nada.
Talvez só isto. Estava a almoçar, vi dois rapazes altos e bonitos. Um deles era um conhecido actor. Podia não ter reparado porque nada neles era incomum ou chamativo. Facilmente passavam despercebidos.
Quando ia a sair, passei pelas salas de cinema. Na entrada, um cartaz enorme com esse actor em ponto grande. Ali, em papel, dava nas vistas. Poderia ele, em carne e osso, passar ali à frente que toda a gente repararia no cartaz e não nele. E apeteceu-me inventar uma história.
Mas, preguiçosa e deambulante à toa como sou, em vez de aqui me pôr a ficcionar, pus-me nisto. Vocês desculpem lá, está bem?
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Olá, UJM!
ResponderEliminarQuer-me cá parecer que esse assunto misterioso de que fala, sem falar, deve ser a tal saia justa em que está metida. Tenho a certeza que vai saber como sair disso, com uma perna-às-costas! :)
Gostei das telas que ilustram o postal, são pinturas da UJM? É que andei a ouvir as entrevistas que deu ao marido e vice-versa, lá nos seus primeiros vídeos.
Tapetes de Arraiolos também eu tive a minha fase, ainda tenho por aí lã e juta e agulha e toda a tralha necessária. Só não sei onde pus a vontade de bordar...
Beijinhos, e que o dia seja muito bom!
Pois é Janita,
ResponderEliminarParte tem a ver com a tremenda saia justa em que me querem enfiar. Eu a dizer que não, não e não e a não conseguir ver-me livre do raio da saia.
Mas a parte misteriosa foi outra coisa e nada a ver com a saia justa: uma reunião mesmo muito, muito misteriosa, com alguém do mais misterioso que possa imaginar.
E também eu ainda cá tenho juta e lãs. Hei-de voltar a isso, tenho saudades. O drama é que, durante a semana, só tenho as noites e as noites são consumidas com o blog.
As telas. Pois foi, esqueci-me de dizer. Não são minhas, não. Mas são muito ao meu gosto: cores, alegria, luz. É arte moderna africana.
Um abraço, Janita!