Muito frio. Ao sol ainda vá mas, ainda assim, se se levanta o vento, logo se infiltra por entre as malhas do meu casaco. Trouxe um de lã macia, grossa e aveludada. Mas foi feito com agulhas ainda mais grossas pelo que ficou solto, leve e, portanto, o ar entra por ele com a maior facilidade.
Quando chegámos a casa, estava mesmo fria. Como gosto sempre de abrir as janelas para arejar, o meu marido veio logo dizer que nem pensar. E à noite já tivemos que dar uso à salamandra. Muito bom, o calorzinho ameno aqui junto a nós.
Ontem estive a ler o livro que tinha começado a ler no carro e do qual estou a gostar muito: Os testamentos traídos de Milan Kundera. É daqueles que estou a ler e a lamentar não ter a capacidade de memorização daquele meu amigo que até desconfio que seja pouco normal (e digo assim para não dizer anormal de todo): memoriza tudo. Tudo. Estamos a conversar e ele lembra-se de passagens de livros e depois di-las. Por vezes são livros que já li e ele diz: 'Lembra-se daquela parte em que ele se insurge e, com uma ironia fantástica, diz que...' (whatever) e eu não me lembro de nada. Até me faz sentir como se estivesse a querer enganá-lo. Este do Kundera dá vontade de memorizar e de transcrever para vos mostrar. Mas, como é bom em contínuo, desisto.
Agora a seguir vou voltar a ele. Já não vou poder deitar-me lá fora, ao sol, a respirar o perfume da figueira. Ou fico aqui ou vou ali para o lado, deitar-me no sofá, talvez com uma mantinha. E talvez deixe que o sono pouse sobre mim.
De manhã andei a caminhar, a fotografar, a fazer os meus vídeozinhos bucólicos, a limpar a casa, a fazer o almoço.
Agora, enquanto estava a escrever, reparei num pequeno vulto ali entre as folhas. Fui ver. Era um cogumelo. O primeiro cogumelo de outono. Fui fotografar.
E só surpresas. Estava também agorinha mesmo a colocar aqui a fotografia, diz o meu marido: 'Olha, um faisão'. Ao princípio nem percebi. Ele disse: 'Aqui à porta'. Nem queria acreditar. Era mesmo. Esta sala tem portas de vidro que dão para a rua. Um faisão lindíssimo passeava-se mesmo junto à porta. Rapidamente peguei na máquina mas ele já tinha ido para o pé da fonte. O meu marido disse: 'Se abres a porta, voa'. Mas, para o fotografar, para ter ângulo, tinha mesmo que abrir. Em silêncio. Mas ele ouviu, sobressaltou-se e voou. Grande, pesado, levantou voo e num ápice deixei de vê-lo. Ainda não estou em mim. Um faisão belíssimo aqui. Este meu heaven é habitado por seres muitos misteriosos.
Bem. Vou ler.
Deixo-vos com um dos vídeos de ontem. O meu marido já aqui esteve a gozar por eu, por muito que queira, não conseguir ter uma voz encorpada e lisa. Sai-me sempre esta voz sumida, com graozinho. Uma irritação. Ele diz: 'Mas se é a tua voz, como querias que parecesse outra?'. Olha, desisto. Paciência. Terão é que pôr o som bem alto para perceberem alguma coisa.
Aproveito para lhe dar os parabéns pelo seu Blog que sigo fielmente. Não sei como comentar o que escreve. Admiro o seu bom gosto e perseverança, sobretudo porque não faz dele uma fonte de receitas mas uma formar de falar com os leitores sobre a atualidade. Gosto muito.
ResponderEliminarFantástico! Comentei o vídeo no Youtube e agora vi como comentar aqui.
E lá está a UJM a por defeitos nos seus vídeos tão belos.
ResponderEliminarEsse espaço é duma riqueza enorme, quer na sua natureza, quer naquilo idealizado ou criado por vós, por isso não é possível fazer um passeio por ele sem uma cadência atenta aos pormenores.
A voz se fosse outra não tinha metade do encanto, é o espelho de todo o adorável cenário.
Venham mais cinco, mais dez, mais mil...
Um abraço e uma boníssima semana.
Li que o vento, em alemão, sopra. Para Herta Müller, em criança, o vento sofria. Em romeno, o vento bate. Ou seja, faz os outros sofrer. Gostaria de dizer à senhora Mullër que, em português, o vento uiva. Gosto de vento que não sofre nem faz sofrer; vento que nos chama, uivando. Herta Müller diz ainda que, em alemão, o vento deita-se. Em romeno, o vento estaca. Gosto de vento que sossega. Descansa e dá descanso. Sossega.
ResponderEliminarTodo este vento por causa do pinheirinho, tão surpreendente quanto frágil. Quebra-se-me o coração imaginá-lo fustigado pela chuva e pelo vento.
Abraço,
JV
Olá Microondas,
ResponderEliminarVi no YouTube qual o seu nome mas como aqui aparece 'microondas' respeito e uso o mesmo nome.
Tem razão: não escrevo ou fotografo ou filmo por qualquer outro propósito que não apenas o prazer de fazê-lo e partilhá-lo. Já fui convidada para participar num programa de televisão, para participar num blog colectivo (e, de facto, com interesses comerciais) e etc mas, pelo menos para já, nada disso me motiva. Um dia que tenha mais tempo, posso partir para outra (não faço ideia de quê) mas, por enquanto, o que me move é apenas fazer isto que aqui se vê.
Agradeço as suas palavras e volte sempre.
Um abraço e uma boa semana!
Olá Franscisco,
ResponderEliminarQue palavras tão simpáticas! Fico contente que goste. Aquilo ali cresce mato e erva por todo o lado mas eu tenho tanto amor e respeito pela natureza que não consigo admitir a hipótese de lá pôr uma máquina a arrasar tudo. É que gosto de tudo, da caruma, das folhas secas, dos ramos caídos, das pedras. E há-de vir a chuva e eu hei-de gostar e há-de vir ainda mais frio e eu hei-de gostar também. E depois virá a Primavera e eu hei-de encantar-me, e o verão e eu encantada também.
Só espero conseguir transmitir isso de uma forma simples, sem aborrecer quem me lê.
Muito obrigada pelas suas palavras.
Abraço, Francisco.
E uma semana em grande!
Olá JV,
ResponderEliminarTão bonito, de novo, o que diz. Palavras que me tocam. In heaven o vento dança. Mas, por vezes, derruba. Encontrei vários ramos caídos e, quando a ventania aperta, fico aflita com medo que aconteça há uns anos quando um grande pinheiro, um grande cedro, um grande cipreste e outras árvores mais pequenas caíram irremediavelmente. Foi um desgosto enorme.
Agora aquele pinheirinho ali, tão lindo... vou vigiando desde que nasceu. Mas que futuro tem ele ali, sobre pedra, sem terra nenhuma. Não percebo como continua a crescer. Já pensei transplantá-lo mas temo feri-lo de morte se o arrancar. Vou deixando e ele crescendo. É um mistério. Uma daquelas dádivas da natureza que temos que agradecer enquanto as testemunhamos.
Um grande abraço, JV. E uma bela semana para si.