Eu tinha 16 anos, andava no último ano do liceu e um dos momentos do ano era o Baile dos Finalistas. O grande salão era adaptado, arrumavam-se as mesas, cuidadosamente decoradas e distribuídas à volta. Ao meio uma passadeira vermelha. E, antes, durante um ou dois meses, ensaios. Ensaiávamos o desfile na passadeira com os nossos pares, depois a valsa que abria o baile. Para além das famílias, eram convidadas as forças vivas da cidade.
Para mim, foram tempos de sufoco. Andava de candeias às avessas com o meu namorado. Orgulho de parte a parte, coisa de adolescentes que davam os primeiros passos no mister da paixão -- já aqui o contei muitas vezes. E, aproveitando a oportunidade, o senhor que haveria de se seguir avançou e convidou-se para ser o meu par. E eu, furiosa por o meu namorado andar armado em parvo e todo ciumento, aceitei ir com esse outro. Aquilo dilacerava-me mas, ao mesmo tempo, era mais forte que eu. E a verdade é que, com isso, cavei um fosso ainda maior entre mim e aquele por quem o meu coração acelerava.
Nessa altura não havia pronto a vestir para vestidos de baile. Escolhia-se um modelo, um tecido e a modista fazia a obra.
Escolhi, na Vogue, um vestido comprido e imaginei-o em cor de fogo. Comprámos a seda. Era cortado na cintura e a saia, evasée, flutuava em torno das minhas pernas. Da cintura para cima era justo. Era de alças, decote redondo, generoso à frente e depois continuava, estendendo-se pelas costas. De facto, era aberto nas costas até à cintura. Não pude levar soutien, claro. Em toda a volta do decote e contornando a profunda linha das costas, tinha um folho plissado. Portanto, quando eu andava, o folho ondulava.
Eu tinha o cabelo comprido com ondas largas e naturais e deixei-o assim. Achava-me o máximo naquele vestido comprido, elegante, uns altos sapatos de fino tacão. Não quis levar qualquer adorno mais pois achava que o vestido muito decotado e fluido chegava como adorno por sobre o meu corpo adolescente quase nu.
Daniela Figo com os pais - uma beleza serena, a dela |
Aquele que o meu coração amava (e odiava em doses iguais) não foi ao baile. Foi o único do nosso ano a não ir. No entanto, quando eu ia a entrar no salão com os meus pais, ia-me dando uma coisa: ele estava à porta, de jeans, camisola desportiva, com aquele cabelo desalinhado de que eu tanto gostava. No meio de rapazes todos em fatos escuros, todos produzidos, e de raparigas que pareciam princesas ou estrelas de cinema, eis que ali estava ele, vestido daquela maneira, deslocado, estranho, quase um intruso. Retardei o passo e, com o coração aos saltos, temendo que ele estivesse ali para armar confusão, perguntei-lhe, furiosa: 'O que é que estás aqui a fazer?'. Ele respondeu : 'Vim ver-te. Estás muito bonita.'. Depois deu meia volta e foi-se embora. E eu fiquei a achar que devia ir atrás dele e pedir-lhe para ficar. Mas isso era se eu fosse outra.
Pouco depois estava eu a desfilar pelo braço do meu par e depois a dançar a valsa, e depois toda a noite a dançar todos os géneros de música.
E durante todo o tempo eu esperei que o meu amor rebelde reaparecesse, que me tirasse dos braços do meu par, que caísse aos meus pés. Não o fez. No dia seguinte comecei a namorar com o outro. De vez em quando chegava a casa e desatava a chorar: o outro adorava-me a achava que era retribuído e eu não sabia como fazer para não o desiludir, incapaz de lhe confessar que aquilo era tudo um mal entendido.
E durante todo o tempo eu esperei que o meu amor rebelde reaparecesse, que me tirasse dos braços do meu par, que caísse aos meus pés. Não o fez. No dia seguinte comecei a namorar com o outro. De vez em quando chegava a casa e desatava a chorar: o outro adorava-me a achava que era retribuído e eu não sabia como fazer para não o desiludir, incapaz de lhe confessar que aquilo era tudo um mal entendido.
Nunca mais voltei a vestir aquele vestido tão bonito. Para mim aquele vestido cor de fogo era o símbolo da minha traição, da minha capitulação. Já não sei que é feito dele. Se calhar a minha mãe ainda o tem para lá guardado mas eu não sinto qualquer gosto em ver coisas do meu passado.
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Só me lembrei disto ao ler o artigo sobre o Baile das Debutantes em Paris, um baile que juntou 23 jovens da mais fina flor da sociedade. Princesas, condessas, todas pelo braço dos seus Cavaliers. Mas também meninas muito ricas e a filha de Annette Bening. E Daniela, a filha de Luís Figo e de Helen Svedin.
Daniela vestiu Jean Paul Gaultier e estava muito bonita. Não sei bem o significado deste baile, talvez apenas a apresentação das meninas da melhor sociedade ao mundo, mas imagino que tenha sido uma noite marcante para as adolescentes que o frequentaram. É bom que haja pricesas para alimentarem o imaginário das meninas que vivem em ruas suburbanas, daquelas ruas em que há clubes locais onde se acolhem os meninos do bairro que gostam de praticar desporto, meninos como em tempos foi Luís Figo que começou por jogar no clube Os Pastilhas.
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A Segunda Valsa é de Dmitri Shostakovich
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Lisboa, ma belle.
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E sobre o desfecho da soap opera, Domingues fica - Domingues sai, queiram, por favor, descer até ao post abaixo.
A Segunda Valsa é de Dmitri Shostakovich
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Tinha em mente contar-vos a linda odisseia que vivi durante este domingo e como rematei o dia paseando num dos meus lugares de eleição.
Mas esta história da diva Domingues e da totozice do primo do Mourinho desconcentraram-me. Depois ainda estive a acabar o meu TPC e, finalmente, desviei-me para isto do baile. E agora, a esta hora, já não são horas para começar post novo. Não posso deitar-me às quinhentas porque esta minha segunda-feira é das que prometem. Tenho que estar bem acordada.
Pode ser que amanhã ainda me apeteça partilhar convosco a minha reportagem fotográfica. Para já, deixo aqui uma fotografia. Uma não: duas, uma inside um sítio onde andei a almocei (perto das 4 da tarde) e outra na rua mas fotografando para dentro (de uma galeria).
Lisboa, ma belle.
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E sobre o desfecho da soap opera, Domingues fica - Domingues sai, queiram, por favor, descer até ao post abaixo.
Sensibilizou-me muito a historia do seu baile de finalistas, que li sempre a 'torcer' pelo seu amor rebelde...
ResponderEliminarEstá tudo a condizer. O seu lugar de almoço e as debutantes com princesas e isso. Acho tudo muito chocho. Bichado. Coisas de um mundo desconhecido e onde não gostaria de habitar. Mas há muito gosto diferente do meu. E ainda bem.
ResponderEliminarOlá Ana Vasconcelos!
ResponderEliminarNa altura, custou-me muito aquela minha maneira de ser e a maneira de ser dele. Éramos os dois uns temperamentais e uns orgulhosos. Quando comecei a namorar o outro, passei por alguns complexos de culpa. Mas depois habituei-me a gostar desse outro. Mas foi talvez por nunca ter tido verdadeira paixão por esse segundo que me sentia disponível para o grande coup de foudre da minha vida, o terceiro que 'chegou como quem chega do nada' e 'se instalou feito um posseiro dentro do meu coração'. Foi com esse que casei.
Um abraço, Ana Vasconcelos.
Olá bea!
ResponderEliminarNão diga isso, bea. Aquele lugar ali no Príncipe Real é uma espécie de centro comercial com lojinhas meio alternativas, um café no átrio central, um restaurante que dá para o jardim. A escadaria é imponente, o edifício é muito bonito -- mas não tem nada, nada, a ver com realezas ou milionarices.
É um lugar cheio de gente nova, turistas, gente alternativa. Se puder, um dia que venha para estes lados, dê uma espreitadela que vai ver que vai gostar. Chama-se 'Embaixada' e é mesmo em frente do jardim.
E ideias para tricots nem imagina... há por lá imenso artesanato.
E olhe lá uam coisa, bea: no seu blog mostra as coisas que faz? Gostava de ver.
E uma noite boa e um dia ainda melhor!
JM
ResponderEliminarPode crer que esse lugar no Príncipe Real cujo nem sei onde seja, não faz o meu género. Por razões que não vale a pena nomear. Além disso, fica-me decerto fora de mão que nunca passei perto (julgo eu, mas pode ser que).
Não, JM. Não gosto mesmo nada de mostrar as coisas que faço excepto a quem as destino. A essas pessoas sim, dá-me um prazer bastante razoável saber que gostam delas e as usam talvez com o mesmo sentimento com que as realizo e só pode ser amor.
No blogue só escrevo. Sem fotos. Sem música. Letras atrás de letras. Escrever descongestiona-me. Não sei se entende, mas é mais ou menos isso. E não escrevo para nada senão para escrever e deixar escrito (perco tudo, já perdi montes de escritos e é um modo de arrumar sem que ninguém me chateie porque estas folhas assim e aquele caderno assado).
É verdade que não sou uma blogger comum, os assuntos normais raramente me levam a postar. Não pego nas chamas que incendeiam as notícias, nos temas fracturantes, nas grandes questões humanas. E, por vezes, nem mesmo se me tocam, passo à escrita; o tempo esfuma e não escrevi. E como não sou noctívaga como a JM e acordo de madrugada sem vontade de escrever, é assim, fica o que fica. Mas gosto de comentar aquilo que afecta os outros, a que por vezes alheio e sou arredia:).
A menina é uma curiosa.