segunda-feira, outubro 10, 2016

Mulheres que gostam de mar







O António Guerreiro, no Público, fala n'A neurose de domingo e eu tenho ideia de que sei de que é que ele fala. Diz ele:
Sabemos que fomos inoculados de maneira irreparável com o vírus da sociedade do trabalho e do regime de repouso e lazer que lhe corresponde, quando passamos a sofrer de um mal que Ferenczi e Karl Abraham, discípulos e colaboradores de Freud, diagnosticaram e ao qual deram um nome: a neurose de domingo. Eles perceberam nas manifestações sintomáticas que emergiam em certas pessoas, ao domingo, o efeito de uma perda infligida à vida pulsional e disseram que ela era semelhante ao que sente o morfinómano quando lhe falta a sua dose habitual. 
(...) A neurose triunfou e não há hoje nenhuma teoria dos humores que não tenha em conta a afecção dominical que contagiou toda a gente. Não lhe serve nenhum daqueles nomes que serviram, desde a segunda metade do século XIX, para designar as “tonalidades afectivas” fundamentais da época: o spleen baudelairiano, o tédio, a melancolia, a angústia, a solidão. Tem características de todos estes humores, aliadas a uma certa astenia moral. (...)

Não quero parecer diferente do resto do mundo mas não padeço deste mal. Agora. Mas tenho memória de já ter sentido o que António Guerreiro descreve. Quando eu era adolescente -- ou talvez, melhor dizendo, pré-adolescente, uns terze, catorze anos -- os domingos eram para mim, um atraso de vida. Habituada a uns dias de semana intensos, chegava a domingo e parecia que não tinha nada que fazer, sentia-me distante daqueles com quem me apetecia estar e o tempo parecia arrastar-se de uma forma pastosa. Não havia internet, telemóveis, os meus pais achavam que eu ainda não tinha idade para sair sem eles e, estava estabelecido, a menos que houvesse festa de anos de amigos ou algum programa mais convencional, era com os meus pais e com a minha família que eu passava aquelas tarde de domingo que me deixavam tolhida de moleza e tédio. Depois as coisas mudaram, Por volta dos quinze já eu tinha um namorado mais a sério, tinha um grupo de amigos com quem havia programas permanentes e os meus pais não tinham, já, como manter-me agarrada a eles. Acho que, desde então, nunca mais voltei a sentir o tempo a arrastar-se colado à pele como um bafo peganhento.
[Ou melhor, senti mas não ao domingo. Senti quando, há uns três, me fizeram artroscopia aos dois joelhos ao mesmo tempo (uma coisa que toda a gente -- médicos incluídos, com excepção para o ortopedista que bem me levou na conversa -- achou uma parvoíce sem explicação e na qual me meti na maior ligeireza e ignorância) e, em pleno verão, ficava em casa, sem nada que fazer, os joelhos inchados e quentes, e eu numa abulia asfixiante,]

Agora adoro os fins de semana, preciso deles, preciso de tempo livre, preciso de poder descansar, passear, curtir. E quero que os domingos sejam longos, longos, que me permitam encaixar neles tempo para rever os meus, para dormir, para ler, para fotografar, para arrumar, para tudo.

Este domingo foi dos bons. Nele coube tudo. Abraços e beijinhos (meus amores mais lindos), e esplanada, sol, e tempo para uma pequena sesta, leitura (o diário de Hein Semke, A Voz Interior), e praia, praia, tão boa, e fotografias, e, ao fim do dia, descanso depois da casa pronta para a semana. E agora aqui. Convosco.


Mas antes, na praia, como sempre encantada, andei a fotografar mulheres que, tal como eu, percebi serem amantes de mar. Umas meninas do surf, outras com namorados surfistas, outras sentadas a contemplar as fortes águas, os barcos, outras aproveitando para distender os músculos. Mulheres do mar.

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Tal como Maria Bethânia, eu que nao sei quase nada do mar, não consigo viver longe dele.

A quem não tem a sorte de viver perto do mar espero que, com as minhas fotografias, consiga trazer um pouco do ambiente, da luz, da energia boa que dele vem. 

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma semana muito feliz a começar já por esta segunda-feira.

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1 comentário:

  1. Pôr do Soloutubro 10, 2016

    Tenho uma paixão pelo mar e por barcos.

    Até casar vivi deles, perto deles, com eles. Vivi com as pequenas traineiras, as lanchas, os arrastões de longo curso.

    Porque não me cruzei com nenhum Onassis,(deixe-me rir um pouco), não cheguei aos grandes paquetes. Mas das janelas da minha casa, sonhava com uma viagem num dos bonitos(para a época) Vera Cruz, Santa Maria ou Funchal.

    Hoje fico fascinada com as "cidades flutuantes" que visitam Lisboa, perco-me a vê-los geralmente à tarde, descerem o Tejo de mansinho, mas não tenho a mesma vontade de partir num deles.

    Por convite de uma amiga almoçámos o ano passado num, cujo nome não me lembro, mas era lindissimo, talvez demasiado grande.

    Depois de algumas horas de visita e encantada com tudo, o meu marido saiu-se com uma frase que arrasou as minhas esperanças de um mesmo pequeno cruzeiro. - Teriam de me pagar muito bem para andar quinze dias aqui metido.



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