Estava numa reunião com um colega quando lhe tocou o telemóvel. É normal espreitarmos e, se não for urgente, desligarmos com mensagem de que retornaremos ou tirarmos o som e deixarmos tocar. Contudo, desde sempre, se é alguém da família, eu atendo. Posso dizer que estou numa reunião e perguntar de que se trata e, se não for urgente, digo que ligo depois. E, do que conheço, isto é prática corrente. O meu colega espreitou e atendeu. Uma voz de mulher. Ele disse que estava um bocado atrasado. Presumo que ela lhe perguntou se demorava muito porque ele olhou para o relógio, olhou para mim, eu fiz sinal de que estavamos quase a acabar e ele disse que não demorava muito. Despediu-se com um beijinho. Explicou-me depois que, quando sai, costuma ligar à mulher e que ela tinha estranhado. Isto acontece-me às vezes: estou com colegas (homens - praticamente todos os meus colegas são homens) e, ao fim da tarde, as mulheres ligam-lhes. Imagino que queiram saber se podem pôr o jantar ao lume ou qualquer outro legitimo aspecto prático.
E eu pensei uma vez mais: na minha casa a mulher sou eu.
Quando cheguei, depois de uma fila de trânsito do caraças, fui ao supermercado. Muitas vezes deixo a comida já feita mas hoje não tinha nada e estava de apetites por uma bela pescadinha cozida, daquelas de anzol, pequenas, acompanhada com feijão verde, batata doce e ovo. Muitas vezes o meu marido vai ao supermercado mas, para comprar peixe ou alguma coisa que tenha que ser escolhida ou a qualidade validada, gosto de ser eu.
Depois cheguei a casa, descasquei as batatas, arranjei o feijão verde, fiz o jantareco. Enquanto o jantar estava ao lume, pus a roupa na máquina de lavar, depois fui arrumar umas coisas, e etc. Agora que aqui estou já jantámos, estendemos os dois a roupa, arrumámos a cozinha, etc. O normal.
E, no entanto, quando falo com mulheres que não trabalham ou que têm profissões com horários mais ligeiros, percebo que acham que a sua casa se move eficientemente porque elas estão ali, sempre presentes, vigilantes, porque com os maridos não podem contar -- e elas parecem achar isso normal porque vida de homem é assim mesmo e graças a deus existem elas, mulheres, para tratar da casa e da família. Não o dizem mas imagino que achem que a minha casa seja uma balda já que tenho pouco tempo para lhe dedicar ou, em alternativa, que achem que tenho empregada a tempo inteiro. Não tenho (apenas tenho uma tarde por semana).
Não estou a criticar. Estou a constatar. De facto, isto é o que acontece na maioria das casas e não é senão o reflexo do que é a sociedade na qual a maioria das mulheres ainda tem um lugar secundário. Nas empresas, na política -- em cargos de decisão ou poder -- a maioria é largamente masculina. O que me intriga é porque é que, em vez de lutarem para que isso mude, ainda tantas mulheres assumem de tão bom grado que o seu papel seja secundário em relação ao dos homens.
Claro que isto acontece sobretudo numa certa faixa etária. Acredito que progressivamente as coisas se vão alterar.
Vem isto a propósito de um vídeo que acabei de ver e que reúne um conjunto de manifestações de machismo a que Hillary Clinton tem sido submetida ao longo dos anos.
Não é fácil a uma mulher ser olhada com desconfiança apenas por se achar uma cidadã de corpo inteiro. Que mantenha a determinação e o sentido de humor apenas lhe acrescenta valor.
Watch Hillary Clinton Answer Nearly 40 Years Of Sexism
"Can a first lady be both popular and opinionated?"
"Men won't vote for Hillary Clinton because she reminds them of their nagging wives."
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Cara UJM,
ResponderEliminarEsse tipo de atitudes machistas não tem a ver com a tal faixa etária, se nisso estivermos a pensar em homens a partir dos 50entas até, digamos, 60entas e coisa, ao que vou vendo. Hoje, há – inúmeros – jovens, rapazes novos, entre os 20intes e 30intas e poucos, com uma dose de machismo que só visto! Em pleno Séc. XXI. Já observei cenas (ou no comboio, ou noutros locais, ou em tribunais, etc) dessa tal faixa etária que deixam muitíssimo a desejar. E depois temos os filhos e sobrinhos que nos vão relatando casos desse tipo que existem e não são assim tão poucos. Para além de nem pensarem em cozinhar, passar a sua própria roupa a ferro, lavá-la, irem ao supermercado e fazerem as compras, etc. Faço tudo isso sem qualquer problema. Ou faz a minha mulher se é ela que está menos ocupada. É assim que as coisa sfuncionam por aqui. E, todavia, eu (e irmãos) fui ensinado a não fazer nada disso, cabia à irmã, ou no caso, às primas, amigas, etc. Mas, depois as coisas mudaram. Eu próprio entendi que da minha parte tinha de mudar. E mudei. Tal como alguns familiares e amigos nossos. Já aqui o disse uma vez, há algum tempo, que não consigo entender que um homem não saiba cozinhar, tratar da sua roupa, da casa, vivendo só ou em comum com a mulher, etc. Um homem deve – sempre – ser auto-suficiente. Sempre! Um homem não deve ser dependente da mulher para essas tarefas do dia a dia. E a relação com a mulher deve igualmente reflectir uma total ausência de machismo. A vida a dois deve ser partilhada em todos os aspectos. Pode sim suceder que um seja melhor que outro nesta ou naquela área, mas um bom e saudável convívio resolve isso. Já tive gente nova cá em casa, amigos dos filhos e vi muita das vezes eles sentados, sem ajudarem népia e elas a fazerem tudo, portugueses e estrangeiros. E também o inverso, mas aqui em doses reduzidas. Se quer que lhe diga e basta ver na imprensa os inúmeros casos, graves, de ciúmes e outras razões, entre jovens namorados, ou na faixa logo a seguir, há muito machismo ainda por aí, nessa faixa mais jovem O machismo está, infelizmente, bem vivo em todas as faixas etárias da nossa sociedade. Até ver.
P.Rufino
PS: quanto à Clinton, é lamentável chegar-se à conclusão ter de se apoiar tal candidatura. Não acredito que os EUA mudem significativamente com ela, tal como nos últimos tempos pouco mudou. Ela sobressai porque o oposto é inaceitável (D.Trump). Pena que Bernie Sanders não tenha sido o escolhido dos Democratas. Aí sim, tínhamos tido algo diferente.