quinta-feira, março 10, 2016

Marcelo - uma nova era em Portugal?


Não acompanhei o que se passou ao longo do dia, a tomada de posse, o discurso, os cumprimentos, nada.



Só agora é que estou a ver o concerto, o Fernando Medina todo folião e feliz, o Marcelo, de boné, todo sorridente, manta nas pernas, com crianças a dançar junto a si, no maior informalismo, a gente que presumo seja da Assembleia Municipal da Câmara (Teresa Leal Coelho incluída) tudo a dançar.


Agora está o Abrunhosa, antes esteve o José Cid. Há pouco estava uma banda que desconhecia mas boa onda, daquelas que, mal ouço, logo me ponho a dançar, HMB. Achei uma boa escolha para as circunstâncias: as pessoas na rua, rindo, dançando, batendo palmas, um clima alegre, de festa.


Há pouco vi o Eduardo Barroso, carinhoso, a falar do amigo. Pelo meio, mostravam bocados do discurso. Gostei. Do que ouvi não tenho reparo a fazer. Gostei*. E dos excertos de reportagem, ele pela rua, tranquilo, falando com as pessoas, também gostei.


E gostei de o ver a falar descontraidamente com António Costa, gostei de ver a afectuosidade de Ferro Rodrigues.

Gostei de o ver o sorriso que, de repente, toda a gente tinha no rosto. Parecia que tinha saído de cima da cabeça das pessoas uma nuvem negra -- e que todos respiravam de alívio, de repente felizes.

E também achei boa ideia ele ter ido à mesquita com um discurso de abrangência e tolerância para com todas as diferenças, incluindo as religiosas. Há notoriamente, nas suas atitudes, marcada influência de Francisco, o Papa. Talvez por isso, segundo me pareceu ler em rodapé, vá fazer a sua primeira visita oficial ao Vaticano. 


Não sei como vai correr daqui para a frente -- e tomara que ele não exagere, não ceda aos seus ímpetos algo populistas (aquela sua necessidade orgânica de agradar, pode levá-lo a perder a noção) ou que não aconteça alguma pouca-sorte -- mas uma coisa é certa: o País precisa de olhar para a frente, para cima, o País tem que querer mais, tem que ambicionar mais e lutar por isso, tem que sacudir o sarro pafiento da crise, tem que esmagar de vez aquela atitude beata de aceitar ordens nefastas e ainda bajular os algozes; e, se Marcelo se propõe pugnar por essas causas, está no bom caminho.


Convivo frequentemente com estrangeiros, especialmente a nível profissional, incluindo com alemães. Acham-se sempre todos os maiores. Todos. E nós achamo-nos sempre menores, sempre prontos a acatar tudo o que vem de fora. E, no entanto, nunca, até hoje, vi maiores capacidades nos outros - excepto em dois aspectos.
Primeiro: em Portugal, qualquer bicho careta se acha o maior da cantareira. A partir de qualquer cargo de direcção, a maioria acha-se importante demais para se meter nos assuntos e, fatalmente, acaba por mostrar alguma ignorância sobre eles; para contornar isso, fazendo de conta que é numa evoluída delegação de poderes, acaba por entregar o poder de decisão a segundas e terceiras linhas a quem, muita vez, falta garra e poder de decisão.
Segundo: por se acharem inferiores, facilmente se colocam em posição subalterna o que, juntando com o primeiro ponto, dá na tão habitual posição de grande parte dos portugueses: de gatas.

Por isso, se Marcelo puxar a auto-estima para cima, se se mantiver a trabalhar bem com António Costa, que é outro lutador e boa-onda e com a colaboração de Ferro Rodrigues, um democrata evoluído, acho que há condições para que Portugal entre a sério num outro período da sua vida.



Recordemos que estamos a sair de um buraco negro gerido por duas criaturas sinistras, Cavaco e Passos Coelho, e por uma inconseguida desestarola, a Assunção Esteves.


Por outro lado, quer Cavaco quer Passos, como qualquer Australopithecus,  desprezavam o PCP e o BE. Ora, estes agora, civilizados e inteligentes como são, não apenas os consideram como os ouvem e reconhecem a valia das suas propostas e a competência do seu trabalho. Por isso, uma coisa é certa: o tempo que aí vem só pode ser melhor do que era, acho que disso não pode haver dúvidas.


E, de resto, vamos esperar que não aconteçam crises externas, hecatombes, desgraças imprevistas que venham dar cabo disto. Porque, se não houver, ou enquanto não houver, acho que todos devemos ao País o esforço de acreditarmos, de não sermos destrutivos, depressivos. Acho que devemos ao nosso futuro o dever de não fazermos abortar qualquer assomo de esperança.


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* Lá em cima disse que tinha gostado das partes que tinha ouvido do discurso. Não ouvi tudo e, mesmo que tivesse ouvido, não teria reparado no pormenor que, com argúcia, o Embaixador Seixas da Costa refere:
Para o retrato a óleo que quis deixar para a posteridade da galeria presidencial, Aníbal Cavaco Silva decidiu escolher, para além do texto constitucional, um clássico económico do liberalismo, "A Riqueza das Nações", de Adam Smith.
Um dos princípios que essa obra consagrou é o da "mão invisível", isto é, a defesa da ideia de que, num mercado livre, em que cada um atua na defesa dos seus interesses económicos próprios, (...) Pelos vistos, o economista de quem tivemos uma década como chefe de Estado cessante também concorda.

Para a esmagadora maioria das pessoas, terá passado desapercebido que, no meio do discurso de posse de Marcelo Rebelo de Sousa, surgiu uma frase em que ele se afirma solidário com "aqueles que a 'mão invisível' apagou, subalternizou e marginalizou". Quase ninguém notou, mas estou seguro que o novo presidente não escreveria o que leu se não quisesse que se notasse essa sua divergência.


Identicamente Ferreira Fernandes, no DN, refere o assunto, dizendo que Marcelo piscou o olho à esquerda e que eles não perceberam.


(Esperto que nem um alho, este Marcelo)

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Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela quinta-feira.

Be happy.

4 comentários:

  1. Como diz e bem, para quem está a sair do mais negro buraco do panorama politico pós 25 de Abril,tudo parece rosas. Não será certamente assim.
    Porém, abriram-se as janelas de Belém - deixe-se sair o odor a bafio.

    Um Abraço.

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  2. Olá Impontual,

    É um facto. E se eu critiquei o Marcelo antes de ele ser eleito... Mas ganhou, é ele que lá está e tomara , para bem de todos nós, que tudo lhe corra bem e que saiba estar à altura dos desafios.

    Mas, de qualquer forma há que reconhecer que, para começo, está a ir bem (mesmo não comparando com os outros que aí até um qualquer burro engravatado era menos pernicioso para o país). E eu acho sempre que o facto de querermos que uma coisa dê certo é meio caminho andado para que dê. E eu nem estou especialmente interessada no Marcelo, eu quero é que as coisas corram bem para o País.

    Um abraço!

    (Presumo que, apesar de ter um blog novo, seja conhecido, dado que teve logo comentários com fartura desde o início. Conheço-o?)

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  3. Pois que seja a bem do país.

    ( agora "teoria da impontualidade"). :)

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  4. Deixei passar um certo tempo de nojo, como convinha, para comentar a posição do BE e CDU na AR, por ocasião da tomada de posse de Marcelo. Não vejo nada de mal e nisto discordo de Ferreira Fernandes e ainda mais de Freitas do Amaral, a quem já pouco ou nada ligo ao que diz e escreve. Estiveram de pé quando tinham de estar e não aplaudiram porque não tinham de o fazer. Aplaude-se quando se está em sintonia. Palavras levam-nas o vento, venham os actos. Embora eu próprio ache que existe alguma frescura nesta nova Presidência, espero para ver quando um dia as coisas se complicarem e se exigir um PR imparcial. Será Marcelo capaz, ou cederá ás suas antigas simpatias políticas? Até posso admitir que seja capaz, mas quem durante 4 anos limpou a imagem do governo PAF, na TV, merece que se tenha uma atitude de expectativa. Como fizeram e bem o BE e a CDU. Faria o mesmo.
    Mas, desejo, sinceramente, o melhor para este novo PR. Oxalá não nos desiluda.
    P.Rufino

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