No post abaixo falei da entrevista do candidato Marcelo que, a meu ver, está a milhas do meu preferido de sempre, o fantástico candidato Vieira. E, porque me deu para as confidências, contei entre quem é que o meu coração, a esta altura do campeonato, balança. Ainda não comecei a pensar a sério no assunto mas, logo que me decida, de tal aqui vos darei conta.
Mas sobre isso falo a seguir. Aqui, agora, a conversa é outra. Falo dos riscos que representa a subida da Frente Nacional nas preferências eleitorais dos franceses ou melhor, falo daquilo que, em minha opinião, leva a uma coisa destas.
Nas eleições, vota-se em quê? Nos programas dos partidos? Que percentagem da população os lê? Baixíssima, imagino. Então, vota-se a partir da publicidade dos partidos? Talvez, mas, em minha opinião, não tanto quanto o investimento em cartazes e folhetos e em comícios poderia levar a crer.
Portanto, sobretudo, em que é que se vota? Nos líderes - digo eu.
Portanto, sobretudo, em que é que se vota? Nos líderes - digo eu.
Não fiz nenhum estudo pelo que apenas posso falar com base na minha intuição:
- uns quantos votam por comportamento tribal (votam no partido de sempre, esteja quem estiver à sua frente, tal como apoiam ferreamente o clube de futebol de sempre, mesmo que detestem o treinador e não conheçam nenhum jogador) e, portanto, constituem a base mínima de apoio;
Cá em Portugal, tivemos recentemente a prova disto. As eleições trouxeram uma novidade que ajudou a virar o tabuleiro do jogo: Catarina Martins mostrou-se convincente, inspiradora, forte. A sua liderança é eficaz: congrega em torno das ideias que defende um número de eleitores que conduziu o Bloco de Esquerda ao terceiro lugar. Um site americano coloca-a entre as 28 personalidades que estão a mudar a Europa. E parece-me uma análise acertada.
- e outros votam em função da personalidade do seu líder e de uma ou outra figura de proa.
António Costa, é outro caso recente. Depois de uma campanha eleitoral débil, mostrou igualmente ser um líder guerreiro, daqueles que, mesmo perante a derrota, se levanta, reúne as tropas, e avança, sem medo, para a frente de batalha como se fora um fortalecido ganhador. Tal como a sua experiência anterior já o demonstrara, está a mostrar ser um indómito lutador, um incansável negociador, um ganhador.
Em França, na esquerda, temos um líder do PS que não tem mostrado outra coisa senão que é uma amostra de gente. Fraco, fraco. Com isto do atentado de sexta feira 13, teve um incremento de popularidade -- tempos perversos, estes -- mas coisa pouca. Numa Europa desidratada e anémica, à mercê dos abutres financeiros, goraram-se cedo as expectativas: em vez da promessa que se aguardava, Hollande logo mostrou ser mais um dos caniches amestrados da Merkel.
O interessante testemunho da sua ex-companheira, Valérie Trierweiler, deixou a nu a sua personalidade pouco firme, piegas mesmo, pateta até, como, por exemplo, quando a imprensa divulgou o seu affaire d'amour com Julie Cayet e ele continuou a fazer declarações de amor ou a perseguir com mensagens tontas a ex, Valérie.
Em França, na esquerda, temos um líder do PS que não tem mostrado outra coisa senão que é uma amostra de gente. Fraco, fraco. Com isto do atentado de sexta feira 13, teve um incremento de popularidade -- tempos perversos, estes -- mas coisa pouca. Numa Europa desidratada e anémica, à mercê dos abutres financeiros, goraram-se cedo as expectativas: em vez da promessa que se aguardava, Hollande logo mostrou ser mais um dos caniches amestrados da Merkel.
O tweet de Valérie que, recentemente, inflamou as redes sociais -- Valérie com uma tshirt que diz: I'm too sexy for my ex |
Mas, enfim, todos os males fossem os comportamentos adolescentes e os croissants do Presidente e a forma aviltantemente arrogante como, na intimidade, se refere aos menos favorecidos, tratando-os por 'os desdentados', ou a forma como Valérie se vinga, gozando com ele, menorizando-o aos olhos dos seus concidadãos. O problema não está aí: está em tudo o resto. O orgulho francês de grande nação fundadora do grande ideal europeu tem sido ferido com as actuações titubeantes de Hollande face aos desafios que os tempos presentes têm colocado a França.
O espírito truculento de Sarkozy, apesar de tudo, apesar dos escândalos financeiros e dos casos judiciais em que se viu envolvido, parece ser, junto da opinião pública, mais consensual do que Hollande. Não obstante se ter também colado à Alemanha, conseguiu ser visto mais como igual do que Hollande, que aparece quase subserviente, um galinho-galador que baixa a cabeça quando uma galinha gorda, como a Merkel, se acerca dele.
Imagino (ou melhor, não imagino) o que será viver em Calais.
Lembro-me de ter estado, há um par de anos, no sul de França, numa pequena cidade onde havia, na altura, romenos por todo o lado. Estacionávamos o carro e apareciam mulheres com os filhos ao colo e pela mão a pedir dinheiro, puxavam-nos pelo braço, andavam ao nosso lado, colados a nós até que lhes déssemos dinheiro, mais à frente apareciam homens a pedir, mais à frente apareciam outros, havia romenos pelos passeios, por todo o lado. Senti verdadeiro incómodo, apetecia-me mudar de passeio a toda a hora para fugir à insistência deles. Algum tempo depois, ouvi que o presidente da câmara de lá queria expulsá-los e pensei que, face ao que os habitantes da terra deveriam queixar-se, até o compreendia. Não é politicamente correcto dizê-lo mas é humanamente compreensível. E eu tive a experiência como turista: imagine-se o que será viver todos os dias numa cidade em que as ruas, as praças, os jardins e todos os lugares estão pejados de gente faminta, suja, desesperada. Imagino que se esqueçam os sentimentos de solidariedade para ficar, sobretudo, a rejeição pelo incómodo desconhecido.
Ora, são sobretudo estas pessoas que apoiam a FN. E, em minha opinião, apoiam-na porque Marine Le Pen aparece como a líder forte, a protectora, a mãezinha que, acreditam eles, se levantará para lutar pelos necessitados, pelos revoltados, pelos franceses, pela França. As bandeiras que Marine Le Pen agita soam bem aos que receiam perder os seus empregos, aos que receiam que as hordas de imigrantes lhes tomem as casas, as ruas, o sossego – legítimas preocupações, convenhamos.
Pode a cura que ela propõe levar a males maiores do que a doença que combate mas isso, para os que a apoiam (e é se reflectirem nisso - o que duvido), será se e a la longue. No que eles pensam é no agora, no já. Sendo preciso que uma voz se levante e fale alto a vontade de defender a França e a segurança dos franceses, segundo uma percentagem grande de votantes, é Marine que a tem. Por isso, para ela foi o expressivo voto de grande número de franceses. E sempre que, para a frente de um partido, for alguém fraco, especialmente nestes tempos de incerteza e receios que atravessamos, logo a população se desviará para onde encontre um líder forte.
Não culpemos, pois, quem assim vota. Culpemo-nos, antes, a nós que condescendemos em termos líderes frouxos, líderes que vivem bem de gatas, que se agacham perante quem acena com dinheiro fresco, culpemo-nos a nós que consumimos jornais e televisões que dão voz a líderes vendidos, palhaços, fantoches, culpemo-nos a nós que damos ouvidos a pequenos arautos do politicamente correcto, a comentadores de meia tigela que apaparicam os pequenos líderes que nada fazem para fracturar este marasmo em que a Europa se transformou. Culpemo-nos a nós que defendemos que se enviem para a Europa os políticos mais inaptos, os que não queremos cá, e que, no momento de votar, nos portamos como uns vulgares cobardes elegendo, para nos representar, figurinhas de quarto e quinto plano que não têm visão, que não têm coragem, não têm mundo, experiência, conhecimentos, gentinha sem qualidades. Culpemo-nos a nós por aceitarmos ser governados por burocratas que impõem sofrimento aos povos por via da austeridade excessiva a troco de nada (ou melhor, a troco da salvação dos bancos), eurocratas que não conseguem reagir atempadamente perante os mais graves problemas, sejam eles um ataque desenfreado dos especuladores financeiros, sejam entradas de avalanchas de refugiados, sejam o avanço crescente de movimentos xenófobos, seja, ainda, a construção de muros que cercam e cerceiam os mais nobres ideais de liberdade e humanismo. Não nos queixemos, nós, os letrados, os ilustrados, os que sabemos tudo, os que sabemos que, por detrás das promessas populistas se escondem riscos totalitários e perigosos, porque, sentindo-se desprotegidos, os mais fracos procurarão sempre a mão forte de quem prometa defendê-los -- e não seremos nós, os bem comportadinhos, que poderemos defender quem quer que seja.
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Lá em cima, Jussi Makkonen no violoncelo e Nazig Azezian no piano interpretam Impromptu op. 5/5 de Jean Sibelius.
As imagens são do fotógrafo abstracto Kim Keever: Random Events
"It took me about two years of imagining what it would look like to totally simplify my working process. When I finally tried just dropping paint into water and photographing the results through a 200 gallon aquarium wall, to my amazement, the paint dispersed in so many interesting ways.
Timing of the shots is crucial and short-lived, as the process of releasing the dyes and pigments quickly transforms into a random event. It is a very freeing process. I can explore color and form like never before.
Even after 20,000 shots I can't predict which will be completely successful and only a fraction are printed. But I have accepted the lack of control and embrace the randomness." – Kim Keever, 2015
* A capa do Le Monde bem como o texto que coloquei como legenda foram-me enviadas por Leitor, a quem muito agradeço.
E, caso vos apeteça mergulhar na realidade nacional, queiram, por favor, descer até à música celestial do Comentador Marcelo.
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Um bom Post, para reflectir. Olhando para aquilo que os “media” nos têm mostrado, quer nas TVs, quer na imprensa escrita, sobre a questão dos refugiados, quase diariamente, ficamos a pensar em toda esta situação. No que respeita aos refugiados, haverá, para termos uma visão mais imparcial, que mencionar, igualmente, os “efeitos colatarais do acolhimento”, chamemos-lhe assim. Embora com alguma reserva, alguma imprensa, pouca, julgo eu, lá vai noticiando certos casos, como por exemplo aquele sucedido aqui há algum tempo atrás, de uma comunidade de refugiados, quase todos de origem africana, no Sul de Itália, que numa “acção de protesto contra as autoridades locais”, decide, simplesmente, destruir tudo o que lhe aparece pela frente, desde viaturas, a lojas, candeeiros públicos, sinalizações, bancos de jardim, enfim tudo, ou quase. Exigindo melhores condições para as suas vidas, naquela localidade de acolhimento! Ou da população de Calais, que vi nos noticiários da TV, nacional e estrangeira, a queixar-se da situação que têm de enfrentar hoje, por terem perdido o seu sossego e sobretudo a sua segurança, a que legitimamente tinham direito, por terem passado a ter receio de assaltos, roubos, agressões, etc, que pelos vistos já vão sucedendo, em virtude das centenas, ou mais, de refugiados, que para ali foram enviados pelas autoridades e ali estão, “temporariamente”, a residir, em inúmeras tendas, por perto. Ou ainda de como se comportam no interior dos comboios (ou camionetas), que os transportam, deixando, uma vez chegados ao destino, um rasto de imundice, de destruição, etc, revelador de comportamentos absolutamente selvagens. Agora imaginemos que somos nós, um dos seus Leitores, que sofre na pele este tipo de comportamentos, atitudes e procedimentos. Como reagiríamos? Com isto em mente, não me choca pois que muitos franceses tenham decidido votar em Marie Le Pen. Há sempre uma explicação para uma determinada votação. Incluindo, ou se calhar sobretudo, tendo presente casos deste tipo. Pergunto-me se, ao mesmo tempo que se recebem os tais grupos de refugiados, não será possível dar-lhes a conhecer e aceitar os nossos comportamentos cívicos, as normas das nossas sociedades, onde se vão inserir, ou seja, dos países e das respectivas populações que, austruística e humanitariamente, decidiram recebê-los? Paralelamente a isto, talvez fosse igualmente útil verificar que tipo de condições de vida lhes estamos a oferecer, quando os acolhemos. Recebêmo-los “e pronto”, pouco ou nada mais fazemos por eles? Serão duas atitudes políticas que talvez contribuíssem ajudar a limar as clivagens, cada vez maiores, em claro e perigoso crescendo, entre populaçõess locais e refugiados. Acolher tão só não resolve o problema, como temos vindo a constatar. E acabará por dar origem a situações de conflito graves entre comunidades - as que acolhem e as que que chegam como refugiados. Que acabarão por ter reflexos políticos. Se calhar pouco recomendaveis. Mas, pior, quem sabe, de consequências talvez irreparáveis. Haja pois bom senso e uma estragégia política para o fenómeno. Mas, do que vou vendo, é coisa que vai faltando. Quanto ao terrorismo, a abordagem é diferente e muito mais complexa.
ResponderEliminarP.Rufino