Uma vez, teria eu uns 16 anos, fui a Madrid sem os meus pais. Ao regressar, quis trazer-lhes uns recuerdos. Acho que para a minha mãe trouxe um leque de renda e umas castanholas pretas que tinham umas bailarinas pintadas, para o meu pai, trouxe uma garrafa já não me lembro exactamente de quê, apenas me lembro de a ter achado invulgar (estou a pensar que seria de cortiça mas não estou certa). E, para a casa - mas a pensar em mim - trouxe o Dom Quixote. Ainda lá está em casa dos meus pais, na língua original, capa de pele castanha, folhas de um papel fino, quase transparente, e com umas ilustrações muito bonitas.
Na altura, tentei lê-lo mas, do que me lembro, não avancei muito, não era bem a minha onda da altura.
E, para dizer a verdade, esqueci-me, nunca pensei em ter um Dom Quixote cá em casa.
Mas, no outro dia, ao ouvir o Patrão da Barca chamada Tempo Contado, J. Rentes de Carvalho, dizer que, depois de, em tempos, ter deixado este livro pelo caminho, se está a redimir - e transcrevo:
(...) Felizmente ainda conheço ocasiões de redenção e continuo a procurar o que ignoro ou desleixei, de modos que me deitei às quase mil páginas da edição comemorativa da D. Quixote. E em boa hora o fiz, logo cativado pelo texto de Cervantes, pela excelente tradução de Miguel Serras Pereira, e a abundância e riqueza das notas.
Com um entusiasmo que devia ter tido na adolescência vou já no capítulo X, onde se conta Do que mais sucedeu a Dom Quixote com o biscainho e do perigo em que se viu com uma caterva de iangueses.
Por feliz acaso, e porque sempre leio mais do que um livro, tinha também começado a leitura do fenomenal The Narrow Road To The Deep North, (*) de Richard Flanagan (1961) vencedor do Man Booker Prize 2014, quando dei com a frase seguinte, a qual, numa ocasião assim, e pela coincidência, quase me fez pensar que, lá do Além, Cervantes mandou que eu a encontrasse, dando-me motivo para "reler" a minha alma:
"A good book leaves you wanting to reread the book. A great book compels you to reread your own soul".
lembrei-me que deveria suprir esta minha falha. E hoje, ao passar pela livraria, lá vi o livro que ilustrava o post do Tempo Contado. Trouxe-o. Estava a um preço imbatível, 10 euros e, como tenho cartão, menos 1 euro.
Apenas me poderei atirar a ele daqui a um bom par de anos mas, até lá, irei espreitando, lendo aos poucos (e escusam os brincalhões de me enviar comentários jocosos por causa disto: vejam, se fazem favor, o post já aqui abaixo para verem a forma como Borges diz que lia).
O arranque do Capítulo 1 é conhecido:
Num lugar da Mancha, de cujo nome não quero lembrar-me, não há muito vivia um fidalgo desses de lança no cabide, adarga antiga, rocim magro e galgo corredor.
Para quem goste de ouvir ler, sugiro o vídeo Don Quijote de la Mancha. Capítulo 1
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Já agora:
Don Quixote trailer (The Royal Ballet)
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Ou seja, para quem possa, é de aproveitar esta edição da editora D. Quixote.
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Um dos melhores livros que li em toda a vida. Reli-o no ano passado, e as gargalhadas que me proporcionou. Para muitos é o melhor romance de sempre (além de o primeiro romance moderno). Para mim é o segundo melhor de sempre, que o primeiro é A Vida e Opiniões de Tristram Shandy, de Laurence Sterne (que é talvez o mais quixotesco de todos os romances escritos e por escrever)...
ResponderEliminarFui a correr comprar o D. Quixote! nos meus planos de leitura sempre inclui esta obra, mas quando olhava para o preço recuava! agora, zás, fui logo comprá-lo! Obrigada!
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