Como sempre nesta altura do ano (e noutras também), estou fora, dois dias no meio do nada. Para ser um retiro espiritual faltam-lhe apenas os momentos de meditação e oração, se bem que, se alargar o conceito, quase se poderia dizer que também o fazemos.
Parte do público alvo está alojado num hotel da cidade mais próxima e um pequeno grupo está alojado na guest house existente no próprio local onde decorre o encontro. Por isso, a esta hora presumo que parte dos meus colegas ande a bater perna pelos bares da cidade enquanto eu estou aqui, nesta casa maravilhosa (e só não tiro fotografias para vos mostrar porque, parecendo que não, ainda tenho algum juízo nesta cabeça) a escrever-vos.
Por aqui, durante o dia e até à hora de jantar, fala-se de estratégia, de concorrência, de negócios, de como as dificuldades não são dificuldades mas sim desafios, de como os contratempos não são contratempos mas sim oportunidades.
Não há lugar para temas luminosos como os que envolvem a ética ou o amor como critérios de gestão nem temos oradores convidados. Nem há lugar para divagações ou angústias, o mundo real não deixa tempo para frescuras. De vez em quando o clima adensa-se, algum lá sai do registo de salão mas logo a coisa se compõe e tudo prossegue como previsto, focado, um objectivo comum. Claro que nos coffee breaks ou cocktails os grupos sussurram private jokes ou não é difícil adivinhar que alguns se dedicam ao corte e costura, metendo as inevitáveis alfinetadas. Mas isso não tem mal, não é nada de mais. As organizações são compostas de pessoas e as pessoas não são máquinas.
Amanhã às 9 horas os trabalhos recomeçam e eu tenho que fazer uma apresentação. Claro que talvez pudesse estar a aqui a ensaiar, quando há cenas destas com dezenas de pessoas e convidados a assistirem, alguns dos meus colegas ensaia. Eu não o faço. Fiz a apresentação, sei o que lá está e, no momento, falo de improviso. Sempre assim o foi e sempre assim o será.
De resto, não sei nada do que se passou hoje. Há bocado quando falei com o meu marido, perguntei-lhe o que se tinha passado no mundo. Disse-me que, por cá, nada, tirando a trapalhada do IRS. Claro. Gente sem tino arranja lenha para se queimar (e, depois de tudo estar a arder, ainda aparecem com cara de tontos a pedir perdão pelos transtornos e o chefe ainda aparece a elogiá-los, dizendo que a situação só prova que os escolheu bem pois não fugiram a sete pés da baderna que armaram). Se esta gente trabalhasse numa empresa, ao fim de meia dúzia de meses levava-a à falência. Nunca vi tamanha incompetência.
Agora dei uma volta pela internet e li que a queda da PT no precipício está a levar várias empresas também ao charco. E muitas mais irão. Muitas, muitas. A queda da PT vai dar um abanão do caraças na já de si tão débil economia nacional. Mas devo confessar que me fiquei pelo título: ler uma miséria destas deixa-me angustiada. Como, de repente, uma empresa que era das mais valiosas do país, que emprega umas 10 ou 11.000 pessoas e dá trabalho indirecto via outsourcing a mais umas 16.000 e ainda a mais uns milhares de pessoas em empresas fornecedoras de tudo e mais alguma coisa, uma empresa que era 'vendida' como de sofisticada governance, comete erros crassos que não tem como corrigir e se vê devorada pela fome encarniçada dos mercados sem que ninguém levante um dedo para a salvar.
Isto é o capitalismo selvagem na sua insanidade mais acabada. Claro que não são só os mercados, tenho que ser objectiva: muito do que era excelente governance não era excelente coisa nenhuma, era espuma, cagança, faz de conta, show off, servilismo perante o dono, palermas endinheirados armados em bons. Mas se isso se aplicava a uma vintena de iluminados, o resto das pessoas era esforçada, dedicada, competente. Mas, claro, o problema está sempre nas elites e em Portugal, salvo honrosas excepções, as elites são muito fracas e, ainda por cima, deslumbradas.
Não quero falar mais disto. Preocupa-me, assusta-me. Somos frágeis e vulneráveis. Conheço pessoas que trabalham na PT, belos empregos, belos níveis de vida, orgulho por trabalharem numa empresa sólida, numa das poucas empresas de bandeira do país. E, de repente, vêm pela ribanceira abaixo, uma derrocada brutal que, na queda, arrasta outras empresas.
Muito deveria ser repensado depois do descalabro do BES e agora da PT. Tanta auditoria, tanta consultoria, tanta compliance e, ainda por cima, sendo empresas cotadas, sujeitas a todo o tipo de escrutínio. E, no entanto, mais vulneráveis que uma mercearia de bairro.
Não basta lavar as mãos como Pires de Lima o fez, ao dizer que os prémios de gestão obtidos por Zeinais e Granadeiros e outros que tais são comprados (toda a gente sabe disso) e que, portanto, com as empresas nas mãos de gente assim, vou ali e já venho. Não basta. Há que ir mais longe e perceber que modelo de gestão e de economia é que queremos para o país um dia não acordar e estar feito em pó, com chineses e angolanos a tomarem conta do que sobrar.
Mas, enfim, estou a maçar-vos com isto, falo e volto a falar no mesmo e isso deve ter maçador para vocês.
Tenho aqui comigo, trouxe para ler à noite - e já estive a dar-lhe uma voltinha e a ver se, antes de adormecer, leio mais um pouco - uma edição especial da National Geographic dedicada a Einstein com subtítulo A Teoria da Relatividade, O espaço é uma questão de tempo. Encanto-me com isto, leio como quem passeia no espaço ou como quem lê um poema invadido pelo silêncio.
Estive a ver se dava para transcrever umas passagens maravilhosas mas não dá. Estou com internet móvel, a pedal e, pior, volta e meia a pen desengonça-se do computador e fico sem internet. Estive a ver se descobria um vídeo interessante sobre Einstein mas isto fica a remoer e ainda não consegui que o youtube se mexesse. Depois o quarto tem uma luz débil, se aponto para o livro quase deixo de ver o computador.
Por isso, fico-me por aqui.
Escolhi imagens relativas às provocações de Banksy apenas porque sim. A primeira, lá em cima, é a sua última obra.
O artista Banksy atacou de novo e desta vez deixou a sua versão do quadro A Rapariga com Brinco de Pérola numa rua de Bristol, Inglaterra. O mural, a que Banksy chamou Girl with Pierced Eardrum (Rapariga com Tímpano Furado) surgiu segunda-feira na zona portuária da cidade.
O trabalho parece ter sido vandalizado na manhã de terça-feira, com uma mancha de tinta preta.
Banksy incorporou uma caixa de alarme no mural, no lugar do icónico brinco no quadro de Johannes Vermeer. O antes e depois da pintura da parede pode ser visto na página de Banksy, assim como vários ângulos do mural visto da rua.
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E agora vou entregar-me à relatividade.
(Se isto estiver cheio de gralhas, por favor, relevem.
Com a internet neste estado e com pouca luz não estou a atinar com isto)
Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma bela sexta feira.
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diz-me com quem andas... - http://observador.pt/2014/10/23/brasil-descobre-foragido-em-festa-de-costa/
ResponderEliminarSe um " post" destes é editado por quem " não está a atinar" faria se tivesse um pouco mais de luz e melhores condições informáticas , estimada UJM !
ResponderEliminarNão lhe desejo qualquer menos bem mas . . . futuro Governo ganharia uma mais valia com pessoas assim habilitadas , sob todos os aspectos .
Melhores Cumprimentos
Vitor
Caríssima UJM, boa noite e um óptimo fim de semana.
ResponderEliminarHB
http://www.dn.pt/inicio/economia/interior.aspx?content_id=4200214&seccao=Dinheiro+Vivo