No post abaixo falei de elos que inesperadamente se ligam, falei de fraternidade e de liberdade. Falei de Luanda, filha de Alípio que foi cantado por Zeca e que agora canta Zeca. Muitos anos separam os gestos de afecto e isso ainda os torna mais emocionantes.
Mas isso é no post abaixo.
Coming home, por favor
Aqui falo-vos da minha casa.
De facto, a minha casa não é uma, mas duas. Complementam-se. Falo da minha casa como se fosse uma única porque para mim é como se fossem duas partes da mesma casa mas, quem por aqui me visita, sabe que são duas e que por elas me divido.
Numa vivo na cidade, perto do rio, levanto-me e tenho o Tejo na minha janela. Espreito o amplo espaço à minha frente e vejo as gaivotas e os veleiros cruzando o azul. Assim começo os meus dias e assim os acabo quando aqui estou.
Na outra, vivo no meio do campo, um vale verde à minha frente e logo uma imensa montanha azul ao longe. Os ventos atravessam o espaço e as árvores e os pássaros são presenças amigas que contemplo e escuto com cuidado e devoção.
Em ambas as casas os livros. Mais do que qualquer outra coisa, é dos livros que eu mais dependo.
Quando estou no campo, in heaven, os livros vão ficando.
Uns vieram para o fim de semana ou para as férias, outros ainda não foram concluidos, outros parece que ali fizeram o ninho. São avulsos, não seguem qualquer lógica. Acomodaram-se uns aos outros e foram ficando.
Transbordaram das estantes de portas de vidro que estão escavadas na parede do corredor (em tempos falei aqui dessa peripécia que, por sorte, não me deitou a casa abaixo e que ainda me arrepia só de nela pensar) e, por isso, agora na sala da televisão, onde temos a salamandra, vou pondo pequenas prateleiras brancas na parede. No outro dia, quando chegámos estavam vários livros no chão. Uma destas pequenas prateleiras tinha dado de si e, na queda, fez cair a de baixo.
De cada vez que quero colocar outra, tenho a resistência do meu marido pela frente, que não quer estar a esburacar ainda mais a parede e que as pequenas prateleiras, assim, com o que lhes ponho em cima, ficam instáveis.
Estive, portanto, a aliviá-las. Agora as prateleiras de cima têm pouco peso a ver se não há novo desastre..
Tenho outra prateleira para colocar, já lá deve estar há uns dois meses, mas já sei que, primeiro que o meu marido se convença, tenho que ir esperando pacientemente.
Na cidade, onde estou neste momento que vos escrevo, a coisa é mais dramática. Tenho móveis com livros em vários locais da casa. A maior parte concentra-se aqui nesta sala mas há também no corredor, no hall, numa outra sala, nos quartos. E depois há os montes, os que estão nesta mesa, os que estão nos cestos, os que estão ao lado dos sofás.
A maior parte das minhas estantes tem portas de vidro e algumas foram desenhadas por mim e mandadas fazer em marcenarias do Norte. Outras foram compradas (modelos clássicos, quase sempre em nogueira mas algumas também em mogno) e, recentemente, rendi-me aos preços baixos e à versatilidade e, portanto, tenho várias do Ikea. Mais: agora, por baixo das janelas, até tenho estantes abertas, coisa impensável até há pouco tempo a esta parte.
Mas nas estantes fechadas, como as prateleiras são largas, aproveito para as encher de objectos. À frente dos livros e dado que as portas de vidro sempre protegem um bocado do pó, aproveito para lá colocar as minhas caixinhas de música, as minhas ampulhetas, os meus bonecos.
Sou toda dada a pequenos objectos, objectos que me acompanham e a que me afeiçoo. Copinhos de vidro pintados à mão, relógios em miniatura, colherinhas de prata, saleiros de porcelana, lupas, um leque antigo em madeira. Há de tudo.
Não há uma lógica, um pressuposto. É tudo do mais variado que há: desde coisas que me oferecem até coisas que vou trazendo dos sítios por onde passo.
Claro que o meu marido, quando me vê a querer trazer bonecada e caixas e caixinhas, tenta demover-me, que já chega de tralha, que não me ponha a gastar dinheiro em porcarias que não servem para nada e sei lá que mais. Mas é escusado. É mais forte do que eu.
Aqui à direita poderão ver uma que trouxe do passeio maravilhoso à Normandia (não sei se já vos falei do passeio que fizemos às praias do desembarque). É tão mimosa, a bonequinha, gosto de passar a mão pela roupa, é uma porcelana macia como seda bordada à mão.
Mas depois, se algumas foram presentes e outras são recuerdos de viagens ou peças especiais, há outras que são apenas bonequinhos que vi e achei bonitos mas que pouco valor material têm.
Estas aqui à esquerda são anjinhas de louça para pendurar na árvore de natal. Achei-as uma ternura e mal empregadas para estarem guardadas à espera da época natalícia e, por isso, agora aqui estão ao pé dos livros de escritores orientais.
Imagine-se se tudo isto não estivesse fechado dentro de estantes com portas. Os pimentinhas haveriam de lhes tratar logo da saúde. No outro dia, o bebé, lesto, abriu uma porta e tentou tirar de lá qualquer coisa. Felizmente, o mais crescidinho também foi rápido e puxou-o logo pelo braço, dizendo esta coisa surpreendente: 'Aí não se mexe que aí é o museu da Tá'. Claro que o bebé ficou a olhar, muito admirado. Museu é conceito que ainda não atinge. Mas achei o máximo. O meu museu. Pois. De facto, é como se fosse. Um museu de memórias, de afectos - e de boas companhias para os meus livros.
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A bela música lá em cima é Coming home de Lizz Wright
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Relembro: se descerem um pouco mais poderão ler e ouvir sobre uma história tocante, uma história que ilustra bem o espírito de Abril.
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Muito gostaria ainda de vos convidar a visitarem-me também no meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa, onde hoje tenho poesia de Carlos Drummond de Andrade dita por Fernanda Torres. A propósito das desilusões de amor falo de um tema que me é mais caro: as ilusões de amor.
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E, com isto, por aqui me fico por agora.
Desejo-vos, meus Caros Leitores, uma boa semana a começar já por esta segunda feira.
de ficar com os olhos em bico - https://www.youtube.com/watch?v=M57Fi19vcSI#t=374
ResponderEliminarGostei muito das suas fotos. Tenho vários livros dos que tem aí...
ResponderEliminarTambém tenho as minhas estantes cheias de coisinhas e uma colecção razoável de livros miniatura e livros pequeninos.
Gostei muito deste post!
O bule é muito giro!
Um beijinho e boa semana!