segunda-feira, dezembro 16, 2013

Esse grande abandono nos braços da vida


No post a seguir mostro um filmezinho inocente que mete uma toalha pós-banho sobre um corpinho nu e tal e coisa, tudo para os cavalheiros poderem ficar com o astral em cima e, logo abaixo, falo do comentário deste domingo de Sócrates e, escrever esse post, a mim também me levantou o astral.

Mas aqui, agora, a conversa é outra. Aqui fala-se de literatura. E de mar.

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E, por falar em mar, que deslizem os Wild Swans, por favor





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Gosto imenso de literatura, isso é evidente. Como dizia Mark Twain, um grande escritor, 'truth is stranger than fiction', a realidade é muito mais bizarra do que a ficção. A literatura tem um significado mas só se mantiver uma independência total, uma irresponsabilidade total. Um escritor não é um pai de família que tem que ser responsável, é uma pessoa que faz o que quer. 

A literatura tem um significado se nos ajuda a compreender o que são o amor, a vida, a morte, o mar. Não é um fim em si. Não é necessariamente um compromisso, mas sim o sentimento do enorme mistério da criatividade da vida.

A literatura é o domínio onde a fantasia, a irracionalidade, a escrita nocturna, o caos podem, no meu caso, encontrar-se com a racionalidade necessária, a razão, a língua, uma certa ordem, que devemos dar mesmo à desordem e ao caos.


Há talvez três momentos na minha escrita. Por vezes é como uma intuição, uma sugestão que pode ser uma notícia lida no jornal ou uma pequena história portuguesa, ou um rosto, um episódio, qualquer coisa. Então começo a pensar, a deambular sem direcção com isso.

Se o tema começa a tomar forma, então agarro-o e talvez comece a trabalhar, depende do tema. 

Se a ideia, o projecto não morre nesse momento inicial, é como numa relação sentimental, começamos a ver a pessoa, telefonamos um ao outro, encontramo-nos, bebemos um café, por vezes isso continua, outras vezes não. Se a ideia, o projecto, me agarram, pelo menos do ponto de vista subjectivo, então há uma fase selvagem em que escrevo sem atenção especial ao estilo, na qual não sou realmente mestre do que escrevo, é como... É torrencial, é isso. É aí que um livro nasce ou não, não é uma decisão. 


Se sinto que o livro nasceu, espero, espero sempre, e depois começo um controlo, uma correcção muito pedante, muito penosa, muito professoral, muito aborrecida, muito fria. Mas o momento decisivo é antes.

Quando escrevo intervenções ético-políticas, aí são como furores, por vezes escrevo em vinte minutos. Surgem quando tenho o sentimento súbito de defender qualquer coisa, protestar, denunciar. Aí a escrita é muito diferente, premente, é como um ataque, um desafio de boxe. Não há tácticas. É um pouco a linguagem do Evangelho - sim, sim ou não, não - diante de uma injustiça. 


E depois há o mar:

Para mim o mar é outra coisa. é o mar da posição horizontal, não da luta para dominá-lo, mas ao contrário, para se abandonar. É o mar da felicidade. É por isso que o mar está indissoluvelmente ligado ao amor, a Eros. Para mim, era inconcebível o amor sem o mar. O mar está também na história da minha vida das paisagens do amor, isto é, desse grande abandono nos braços da vida. Nado muito mas isso não tem nada a ver com o desporto, não, é realmente abandonar-se em grandes braços amorosos.


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O texto acima, em itálico, é um conjunto de excertos colhidos e transcritos de forma não ordenada da excelente entrevista concedida por Claudio Magris a Ana Sousa Dias e que pode ser lida na Revista LER de Dezembro.


no outro dia aqui tinha dito, meio a brincar, meio a sério, que engalinho com homens que se arrebicam todos: prefiro os homens au naturel (au naturel quais ostras - ostras que, ao contrário dos homens, são geralmente saborosas e afrodisíacas; os homens, pelo contrário, têm que ser bem escolhidos para reunirem as duas características). Se, então, são do tipo capachinho, cabelo pintado, anel de brasão, fio com medalhinha a deixar-se entrever, pulseirinha, alfinete de gravata, camisa de uma cor e colarinho branco ou outras mariquices de mau gosto, tenho muita dificuldade em olhá-los com respeito. 

Por isso, quando vejo o Magris agora de cabelo todo castanho-acaju sem um cabelo branco, sabendo que o homem tem setenta e tal anos, e isto depois de já o ter visto com cabelo de cor parda e franja ridícula, ou cabelo negro asa de corvo, dou um passo atrás e reconsidero o que penso do que ele escreve.

Mas, lendo a entrevista, volto a pensar que é um homem cuja conversa cativa e que a falar deve ser quase tão interessante como a escrever - e dou, de novo, um passo em frente.

Ou seja, vou continuar a lê-lo de gosto (tenho andado a ler os Alfabetos e é uma escrita lúcida e límpida que dá gosto) e o melhor é abstrair-me desta cena do cabelo. Paciência. Ninguém é perfeito.


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As três primeiras fotografias foram feitas este domingo in heaven (e que bem que se estava lá, um cheiro a terra húmida, o musgo a atapetar a terra, as folhas caídas a deixarem no ar um odor orgânico, íntimo, e a lua clara e quase indiscreta escondida atrás das árvores, a noite a chegar-se num azul sumptuoso, tudo tão bom, tão acolhedor, dá-me vontade esconder-me numa gruta nas rochas, ou debaixo das ramadas pesadas e perfumadas dos cedros, alimentar-me de frutos, reduzir-me à minha condição de animal).

A última foi feita no Ginjal, numa manhã especialmente adornada pelo frio e pela luz.

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A canção, que acho muito bonita, é Wild Swans e é interpretada por Bill Ryder-Jones. 


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Relembro: abaixo deste há mais dois posts, um filmezinho à maneira e outro sobre Sócrates e Passos Coelho.

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Muito gostaria ainda de vos convidar a visitarem o meu outro blogue, o Ginjal e Lisboa, onde hoje tenho José Régio dito por Bruno Huca, uma agradável surpresa, e tenho palavras minhas que percorrem os caminhos misteriosos e belos como céus cheios de pequenas estrelas que são, nem mais, os caminhos da minha vida. E tenho uma fotografia de que muito gosto (modéstia à parte).


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E, por agora, por aqui me fico. 
Desejo-vos uma semana muito boa a começar já por esta segunda feira. 
Saúde, bem estar, alegria, afectos - é o que vos desejo

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