quinta-feira, outubro 10, 2013

Este mundo civilizado não é para velhos. "O escritor Knud Romer fala sobre a morte de seu pai e a solidão dos idosos na Dinamarca, um país várias vezes eleito o mais feliz do mundo.". "Uma folha cai ao Céu" é o nome do documentário sobre o pai de Romer, produzido por Didde Elnif e Anders Birch.


Enviado por um Leitor, este filme deixou-me com o coração apertado. Não gosto de ver estas coisas. Estes velhos no corredor do hospital ou esta situação de não podermos ter em casa os velhos da nossa família é qualquer coisa que me toca fundo. Podiam ser os meus pais, posso ser eu daqui por uns anos.

Vivo numa cidade, os meus pais vivem noutra. Gostam de viver na sua casa. Trabalho o dia inteiro e passo no mínimo duas horas no trânsito. Ou seja, mesmo que eles quisessem viver na minha casa (e isso não lhes passa pela cabeça), eu não estaria em casa para os acompanhar.

Talvez que, quando as pessoas vivem perto umas das outras, quando há uma rede de apoio que protege uns e outros sem que nenhum dos envolvidos se veja desenraizado, a coisa seja menos gravosa. Agora nas grandes cidades, com os mais novos a trabalharem... é tão difícil.

Depois os hospitais... é terrível. Uma das vezes em que o meu pai teve um problema, como era urgente entrou logo. Mas entrou e ficou à espera num corredor onde estavam outros doentes urgentes. O meu pai estava numa cadeira de rodas e, por um estranho fenómeno, quando ali chegou parece ter ficado mais estabilizado, mas, ao lado dele, estavam várias pessoas em macas. Um vomitava, vomitava-se todo, chorava, pedia ajuda, uma coisa horrível, outro fazia uns barulhos que parecia que ia morrer ali mesmo, um estertor medonho, outro tinha sido esfaqueado e escorria sangue por todo o lado. Tudo exposto, sem pudor, ao lado uns dos outros. Eu que, até há algum tempo, tinha pavor a hospitais, vi-me ali no meio daquela desgraça, a não poder furtar-me à visão da degradação humana, sem intimidade, a fragilidade mais absoluta. 

O meu pai, sabendo da minha incapacidade em movimentar-me naqueles meios, lamentava-se 'tu que tens tanto medo destas coisas...'. Mas o medo passou-me, tinha vontade era de ajudar aquelas pessoas. Podia ser eu, ali numa maca no corredor, desamparada.

Como é que se pode olhar para esta realidade com a frieza dos números sem se perceber que são pessoas, que são os nossos pais, que somos nós?

Meu Deus. 

Agradeço ao Leitor o ter-me enviado o filme aqui abaixo. Num país tão rico como a Dinamarca, surpreendo-me ao ver isto. Não sei se faz algum sentido o caminho que o mundo está a percorrer, quando vejo coisas destas.

A tradução não é famosa, há frases que soam estranhas mas, enfim, dá para perceber.




Transcrevo do que se encontra no Youtube:

O escritor Knud Romer fala sobre a morte de seu pai e a solidão dos idosos na Dinamarca, um país várias vezes eleito o mais feliz do mundo.


"Uma folha cai ao Céu" é o nome do documentário sobre o pai de Romer, produzido por Didde Elnif e Anders Birch.


1 comentário:

  1. Há qualquer coisa de estranha neste mundo ocidental a que pertencemos. Estas Democracias, depois de terem erradicado a iliteracia, a doença generalizada, diminuído em grande parte as diferenças sociais, garantir direitos ás mulheres e minorias, etc, etc gradualmente, começou a desconsiderar os idosos, os doentes velhos, ou seja, a trata-los como descartáveis e indesejáveis, a despreza-los.
    É verdadeiramente assustador a evolução das nossas sociedades europeis e ocidentais. A própria família aos poucos vai-se desintegrando, filhos convivem cada vez mais com os amigos, cada vez menos com os pais, não querem saber dos tios, dos avós, de ninguém a não ser o mundo deles. Assisto a este evoluir de coisas desde há uns anos. Sobrinhos nossos que vivem em Lisboa, que veem “n” vezes a Cascais onde vivemos e nunca nos telefonam, nunca aparecem, nunca nos dizem o que quer que seja. Só nos encontramos em épocas festivas e mesmo assim quando calha estrmos todos juntos. Nem um telefonema, nem um mail, nada! Ainda hoje, contacto velhos tios e tias, desloco-me ao Douro e à Beira-Alta com alguma regularidade para rever familiares e estar com eles, além de gozar aquelas regiões. Sou, quando falo disto, um perfeito “marciano”. Os afectos e afectividade já não fazem parte de uma boa parte das gerações mais novas. Não quero generalizar, naturalmente, mas é um comportamento de muitos. Meus filhos ainda enviam postais aos avós, contactam-nos pelo telefone, mas os primos não querem saber. Não telefonam, nem aparecem. E com os filhos de amigos, ao que vejo, sucede o mesmo. Se não querem saber de nós com 50-60 anos, porque se irão incomodar quando tivermos 80-90?
    Aqui há um par de anos, tive de ir à Holanda de quando em quando, em trabalho e como tinhamos por lá um amigo português, casado por lá e por lá a viver há uns 40 anos, como investigador e professor universitário, ouvi da parte deles isto: as filhas a partir do momento em que foram para a faculdade, viver noutras cidades, com pouco mais de 18/19 anos, aos poucos deixaram de aparecer, de os contactar, de os visitar. Diziam-me: “enfim, aqui é assim, estão a iniciar as vidas delas e aos poucos nós deixamos de ser uma prioridade para elas. É assim!” Assustador! E depois um dia, eles velhos, onde vão parar? Quem quererá saber deles? Ninguém, já que nem o Estado se interssa.
    Noutros países, como na Ásia, Africa e América Latina ainda vai subsistindo uma forte componente familiar e respeito pelos mais velhos. Mas até quando?
    Bagão felix fez ontem, a este propósito, uma citação de François-René de Chateaubriand muito interessantee...e actual!
    P.Rufino
    PS: ontem li algures que os velhos na Alemanha vão acabar os seus dias para a Polónia, onde são melhor tratados!
    Para onde se caminha?

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