terça-feira, novembro 27, 2012

'Beije-me com os beijos da sua boca, melhores tuas carícias do que vinho'. 'Vem meu amado, corramos ao campo, passemos a noite sob os cedros'. O Cântico dos Cânticos, numa tradução do hebraico de José Tolentino de Mendonça. Fotografias de Ben Hassett e Mario Testino.




 
          beije-me com os beijos da sua boca
          melhores tuas carícias do que vinho     o aroma dos teus perfumes é melhor
          tua fama é odor que se derrama      por isso as raparigas amam-te
          arrasta-me atrás de ti corramos      fez-me entrar o rei em sua penumbra
          folgaremos e alegrar-nos-emos contigo      lembrar-nos-emos de teus amores mais que do vinho
          com razão as raparigas amam-te




                  Vem meu amado        corramos ao campo       passemos a noite sob os cedros
                  madruguemos pelos vinhedos
                  vejamos se as vides rebentam
                  abrem seus botões
                  se já brotam os cachos
                  lá te darei as minhas carícias
                  as mandrágoras exalam o seu perfume          à nossa porta há toda a sorte de frutos
                  frutos novos frutos secos que eu tinha guardado    meu amado para ti




                                       Quem é essa que desponta como a aurora        bela como a lua
                                       fulgurante como o sol       terrível como as coisas insignes?


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Só muito tarde se leu a noite e o desejo, o corpo nomeado, perseguido, suplicado, o jardim entreaberto, a prece atendida.

É este o sentido natural do Cântico dos Cânticos. (...) O silêncio de Deus.



(Da introdução, também da autoria de José Tolentino Mendonça. Este livrinho contém desenhos de Ilda David)


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A primeira e a última fotografias são de Ben Hassett. A do meio é de Mario Testino.

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Se isto não faz o vosso género e preferem ler alguma prosa sobre o que gente ilustre diz da austeridade, do excesso de austeridade e da dívida e desta treta toda, convido-vos a descerem até ao post seguinte. Paul de Grauwe, inclusivamente, formula um conselho ao 'seu amigo' Vítor Gaspar de quem garante não ser conselheiro.

E se vos apetecer ler as minhas palavras desenhando metáforas em torno da metáfora de Fernando Guimarães, então, por favor, clique no Ginjal e Lisboa. A música continua a ser Froberger, uma agradável surpresa.

***

E é isto. Tenham, meus Caros leitores, uma bela terça feira. 
Apesar dos apesares, a vida ainda é uma coisa surpreendente.


10 comentários:

  1. JOAQUIM CASTILHOnovembro 27, 2012

    Gostei e muito!

    A UJM é um rio inesgotável de belos textos, seus e alheios, e uma força da Natureza inesgotável, para os fazer chegar até nós, mesmo depois de um dia de trabalho!


    Obrigado!

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  2. Olá,
    Melhor do que o buquê de um vinho velho e de rara colheita, só mesmo um beijo que nos deixe a boca sequiosa de mais.

    Abraço

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  3. Que dizer da beleza, da capacidade que estes textos têm de nos reconciliar com a vida?

    E as fotografias? Conciliar estes dois factores não é muito fácil, mas a UJM fá-lo de forma magnífica.

    Ia agradecer, mas não, não agradeço.
    Ingrata, eu?
    Não!
    Não o faço porque o prazer que se adivinha retirar da arte da escrita, bem como da selecção das belíssimas imagens que posta é tão notória, que dizer o que quer que fosse seria uma inutilidade.

    Abraço.

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  4. Subscrevo de novo “jrd”. Na sua frase, só alteraria, com sua permissão, em vez do ponto final, três pontos: “etc, etc, um beijo que nos deixe a boca sequiosa de mais...”
    E eu gosto e bem de um bom vinho.
    Há uns bons anos atrás, por ocasião da vindima na Provença, os rapazes tinham o direito de beijar as raparigas...se estas deixassem cachos esquecidos nas cepas. Ora bem!
    Há um quadro de Munch, que se pode ver na Galeria Nacional de Oslo (que me ficou na memória, quando por lá passei uma ocasião), que nos mostra uma rapariga deitada num sofá (creio) num sono profundo...após “ter beijado”, naquele caso, demasiado vinho.
    Quanto ao Gaspar, não tenho dúvidas, o homem não quer saber das boas coisas da vida, como um bj profundo, daqueles que nos comprimem a alma, ou de degustar um bom vinho, com um “bouquet” capaz de nos fazer esquecer os azares do dia.
    Não, o Gasparzinho só gosta de “confitado de contribuinte”, uma daquelas “choldras” que tipos cinzentos (como ele), que só gostam de viver no pó dos gabinetes e entre cortinados de ripas, apreciam. Nada sabem da vida, nem sequer que nessa vida há coisa muito boas, como o tal bj e o tal vinho.
    P.Rufino
    PS: num Post anterior mencionou, numa resposta a um comentário, o Sol Parque, a Tratoria, as Amoreiras, o Rato, Castil, a Buchholz, etc, etc. Ou seja, tudo sítios e locais que conheci bem entre 68 e 76, pois ali vivia perto (muito antes do “Centro Comercial das Amoreiras”, num edifício, no caso no último andar, o 11º, edifício que ali continua, ao cimo da Av. Duarte Pacheco, onde, em tempos, existia, perto ou em baixo, não recordo bem, um stand da Datsun. Mas com cada filho a querer seguir o seu caminho, os nossos pais venderam posteriormente o apartamento. Quem sabe que, se calhar, ainda nos cruzámos no Sol Parque! O mundo é engraçado)




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  5. Olá,
    Mais um texto muito belo, muita inspiração, imaginação e fotos muito bem seleccionadas, criando assim este saboroso cocktail de beleza, uma verdadeira lufada de ar fresco para nos fazer sorrir...
    Bem haja e um beijinho
    ME

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  6. Olá Joaquim Castilho,

    Qual força da natureza, Caro Amigo, se me visse agora, cansada e a querer dormir. Deitei-me ontem às 2 da manhã, acordei ainda não eram 6 e só cheguei a casa, agora, já passava das 11 da noite. E amanhã outra vez cedo a pé. Força da natureza é o Prof. Marcelo que, nestas condições, estaria a responder a dois comentários ao mesmo tempo enquanto lia um livro e pensava num parecer.

    Nem sei como é que, depois de responder aos comentários, vou conseguir escrever alguma coisa... Quase que se me fecham os olhos, sabe lá.

    Mas sabe-me bem, assim cansada, ler palavras tão simpáticas.

    Obrigada eu!

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  7. Olá jrd,

    Concordo e olhe que eu também gosto de um vinho velho.

    Ontem apeteceu-me pegar nisto. Tantas vezes se renega o corpo e o que de bom ele nos proporciona em nome de conceitos que se pensa virem da religião, pensada em sentido geral. E, afinal, fazendo uma atenta releitura biblíca encontram-se poemas de um lirismo amoroso e exaltado em que a censura não reside.

    Um abraço, jrd.

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  8. Olá GL,

    Tal como referi acima, quis mostrar imagens actuais em que é visível uma certa sensualidade juntamente com poemas do Cântico dos Cânticos, justamente traduzidas pelo Padre José Tolentino Mendonça.

    Eu, como é sabido, não sou dada a moralismos, a preconceitos - muito menos, claro, a beatices - e acho que muito do sentimento de culpa que vive dentro das pessoas (em especial, das mulheres) vem de muito cedo, inculca-se isto nos miúdos. E isso inibe e faz com que muitas pessoas se sintam culpadas ou envergonhadas quando sentem desejo ou prazer.

    Por isso, ontem me lembrei de juntar estes dois mundos.

    Obrigada pelas suas palavras, GL!

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  9. Olá P. Rufino,

    Mais um dos seus gostosos textos.

    Eu só há alguns anos comecei a apreciar vinho. Acho que já aqui o contei. Antes, se bebia, dava-me sono. E não sabia beber.

    Beber um bom vinho (tal como beijar) tem que ser feito com alguma sabedoria.

    Frequentei um curso dado por um conhecido escanção. Começámos por aprender a distinguir águas e, aí, provando muitas, desde a simples água de mesa banal, a uma rara do Japão, quantas diferenças.

    Mas, quando passámos aos vinhos (branco, rosé, tinto, etc), aí abriu-se-me um novo mundo. Saber sentir o aroma, saber estacionar o vinho na língua para que todas as papilas o sintam, e beber devagar. E, então, não apenas comecei a saber distinguir sabores, o baunilha, as frutas, a madeira, etc, como comecei a beber sem que me deixe dormir logo a seguir. Claro que não bebo muito mas o que eu agora aprecio um bom vinho...

    Quanto ao prédio que diz, muito bem o conheço. Mas eu quando trabalhei por aí já foi depois disso, talvez a partir de 78 ou 79, não me lembro. Sei que já lá assisti às obras do CC Amoreiras. Nos primeiros anos pós 25 de Abril, vivia na Artilharia Um. Por isso, anos e anos a andar por essas bandas. O que é engraçado é como parece que tanta gente de entre nós afinal andou pelos mesmos locais nos mesmos tempos.

    Não dava isto um filme engraçado?

    Um bom dia para si, P. Rufino, com boa comida, bem regada e com tudo o resto a que tenha direito!

    PS: O Gaspar a beber vinho? Ná... Também não acredito. É menino para acompanhar a refeição com coca-cola ou ice-tea.


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  10. Olá Maria Eduardo,

    E no entanto são trechos biblícos, já viu? E são palavras que nos são trazidas numa bela tradução pelo Padre Tolentino Mendonça. E que bela introdução ele aqui escreve. Aliás, quem escreve não é apenas o padre. É
    também o Poeta.

    Muito obrigada pelas suas palavras, fico contente que tenha gostado.

    Um beijinho, Maria Eduardo

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