Os meios de comunicação social noticiam hoje aquilo que estamos fartos de saber mas que nem ousamos balbuciar, quanto mais dizê-lo assim, loud and clear: Merkel defende a perda de soberania para os países que incumpram as regulamentações estipuladas.
Ultrapassou o défice? Portou-se mal? Não tem problema: alguém fará pelo país o que o país não conseguiu ou não quis fazer por si.
E a questão está nesse pequeno apontamento ('ou não quis') – porque uma coisa é um país ser governado por um bando de delinquentes ou incompetentes ou, mesmo, néscios da pior espécie e até poder ser boa ideia que alguém lhe deite a mão, e outra, bem diferente, é um país conscientemente optar por uma política diferente e, fazendo-o, arriscar-se a perder a soberania.
Há já algum tempo que venho temendo coisas destas.
A União Europeia é um exercício de vontade utópica e de wishful thinking. Ainda mais o é a união monetária. Aí, constatamos agora, foi aquela insustentável leveza do ser. Chegaram-se uns aos outros e, para ficarem mais quentinhos, ou mais parecidos, ou mais qualquer coisa, resolveram usar a mesma moeda. Mas a moeda é um instrumento estruturante num país. Ora, juntando-se países com culturas díspares, níveis de crescimento e produtividade díspares, mecanismos regulatórios díspares, base de partida díspar, tudo díspar, e todos a usarem a mesma moeda só podia mesmo dar nisto.
É a mesma coisa que colocar numa mesma corrida, com um único regulamento, a Jessica Augusto, a Rosa Mota, a Aurora Cunha, a Teresa Guilherme, a minha vizinha do 2º andar que tem 20 anos, eu própria e mais umas quantas escolhidas ao acaso (e isto mantendo o critério de serem todas mulheres, porque podia até incluir homens). O resultado está à vista. Uns derreados, de gatas a meio da prova, outros, um pouco mais à frente, a atirarem-se estendidos para o chão, e alguns ainda mais ou menos frescos.
Face a isto o que se faz?
- 1 - Interrompe-se a corrida por manifestamente não existirem condições para a levar a cabo?
Interrompe-se…? Mas isso é assim? Depois deste esforço todo, interrompe-se? E o dinheiro que já se gastou com isto tudo, quem é que o paga? E quem suportará as despesas até que estejam todos em condições, se é que alguma vez o vão estar?, gritarão alguns.
- 2 - Retiram-se (em maca) apenas os que ficaram exauridos pelo caminho e os outros prosseguem?
E o que acontece a esses? Quem lhes paga os tratamentos? Quem os mantêm e até quando?
- 3 - Os mais fortes pegam nos mais fracos ao colo e prosseguem, sendo que, desta forma, os mais fracos deixam de contar e passam a ser meras excrescências dos mais fortes?
Mas não acontecerá que os mais fortes também não vão conseguir acabar a prova, pois, com outro ao colo, facilmente se irão também abaixo das canetas?
»»»»» Eu não sei qual a melhor resposta - mas acho que é isto que se está a passar.
Alguma decisão se vai ter que tomar – e a curto prazo – sob risco de os mais fracos fenecerem pelo caminho, até que chegue uma resolução.
Mas e as claques…? Vão ficar sossegadas, caladas, nas bancadas a ver o que se está a passar?
Ou saltarão para a pista, tentando impedir soluções que não lhes agradem, pegando-se à tareia com a comissão organizadora, com as outras claques?
Ou os mais fortes colocarão os seus seguranças em campo para reprimirem desacatos?
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E nem me apetece continuar com mais figuras de estilo porque aquilo de que estou a falar não me parece que seja ficção, parece-me antes uma antevisão do que pode estar para acontecer.
… A menos que alguém, um visionário qualquer, um líder forte, convincente, agregador, se levante e trace uma linha de rumo que permita pegar em fortes e fracos e arranjar pistas e regulamentos próprios para cada um. Talvez seja isto aquilo a que Mário Soares chamava a necessária Refundação da Europa.
Mas mesmo que um milagre desses acontecesse, são coisas demoradas e a crise está já aí, brava, dolorosa e, como todos antevêem e o ministro Vitor Gaspar vem avisando, tende a agravar-se (cá - mas também na Grécia, em Espanha, em Itália, ...).
Por isso, apesar de ficarmos chocados e com razão com a ideia da Angela (…há fantasmas ainda demasiado vivos) tenhamos bem claro que o que ela preconiza é uma das vias (no meu exemplo ali em cima, é a hipótese 3). Há outras mas, não aparecendo por aí um Messias, não sei qual a melhor.
É um jogo, este, em que temo que não haja vencedores.
Aqui andamos, Caros Amigos Leitores, a correr - mas para onde? Atrás de que miragem andamos nós?
Por isso, meus Caros Amigos, uma vez mais daqui vos lanço um apelo: velinhas, velinhas a todos os santinhos, já. Sempre acesas.
[E agora, meus Caros, não quero que fiquem aborrecidos. Desçam um pouco para recolherem a vossa entrada na 'Música no Ginjal' que hoje há beleza superlativa e não há melhor para afastar tristezas do que a beleza, do que a música. Desçam, por favor]
Minha querida
ResponderEliminarSe nestas condições aparecer um agregador, um salvador, dificilmente ele não será um ditador.
Lembram-se das críticas que MFL sofreu, quando, com humor, propôs suspender por seis meses a democracia?!
É isso, Helena, que temo. Lembro-me sim e na altura, embora me tivesse custado ouvir, no íntimo percebi muito bem o que ela quis dizer.
ResponderEliminarQue tempos, estes, Helena.
Pensava que os meus filhos iriam ter um futuro mais descansado, mais próspero que o meu, que os meus netos haveriam de viver num mundo ainda melhor, e agora temo tanto que, um destes dias, possa ir tudo por água abaixo.
No entanto, ainda tenho alguma esperança que, à última hora, comecem a aparecer soluções. Mas não vejo é quais.
Gostei muito do seu texto e da opinião, claro está. Ainda não tinha visto a coisa da forma que "pintou" e também não sabia dessa ideia da sra.Merkel. Costumo pensar isso sim que qualquer dia ainda estala por aqui outra guerra, afinal e embora o Hitler fosse doido, foi a seguir a uma grave crise que estalou a II Guerra Mundial. Eu espero bem que não, que tudo se resolva.
ResponderEliminarParece que em vez de se evoluir, andamos a perder mais e mais qualidade de vida. Qualquer dia voltamos ao tempo dos nossos Avós.
Um abraço.
Marco,
ResponderEliminarÉ muito preocupante tudo isto e todos os dias aparecem nuvens mais negras a turvar o horizonte.
Tomara que acabe tudo em bem mas uma coisa é certa: estamos a regredir, a empobrecer, a ficar cada vez com menos direitos. É triste e preocupante.
Um abraço, Marco.