. I .
Nisto do amor, os homens são como os cães (e as mulheres também; mas centremo-nos agora nos homens).
Quando detecta medo, o cão fica com maus instintos, fica desconfiado, olha de lado, rosna, perde a afectividade e, se a ocasião se proporcionar, ao primeiro movimento, é mesmo capaz de pregar a partida.
A mesma coisa se passa com os homens.
Ponham-lhe uma mulher assustada, carente, frágil, insegura, à sua frente e eis que que eles se perfilarão logo para cantar de galo, para fazer das suas. Nem é consciente, é mesmo uma coisa de instinto. No fundo, percebem logo que aquela mulher arrasta, do passado, um lastro grande, que algum ressabiamento acabará por vir ao de cima, que em algum momento quererá cobrar dívidas causadas por terceiros – em suma, perceberão instintivamente que a coisa tem todos os condimentos para não correr bem. Talvez por isso, fiquem eles próprios à defesa, preparados para não se envolverem, para saltarem fora quando a coisa esfriar ou der para o torto.
Por isso, primeiro conselho: uma mulher nunca deve mostrar a um possível novo affair o seu passivo, nunca deve mostrar feridas ainda em aberto, nem sequer cicatrizes, nunca deve mostrar desconfiança, nunca deve mostrar que é uma pobre coitada a quem os malandros anteriores fizeram sofrer – é que ninguém, salve a Madre Teresa de Calcuta e afins ou quem esteja em missões de voluntariado, tem pachorra para perder tempo a resolver problemas causados por outros. A atitude adequada é mostrar (e sentir!) segurança, abertura de espírito, compreensão, empatia, boa disposição, alegria, bom feitio.
. II .
Nisto do amor, não nos podemos esquecer que os homens (e as mulheres) são animais. Ora, há no reino animal mecanismos que funcionam no sentido de seleccionar o parceiro sexual (porque quando se escolhe um parceiro, escolhe-se em primeiro lugar como parceiro sexual, porque na natureza impera o instinto de reprodução mesmo que isso esteja fora de causa. Sentimentos como o amor ou a amizade são os add-ons que transformarão a simples atracção física num envolvimento mais profundo e duradouro).
Por isso, nada deve ser forçado. Se um homem não desperta interesse físico numa mulher, então é para esquecer. Claro que, por vezes, não há um coup de foudre imediato. Muitas vezes a atracção física vem depois, há um despertar que vem progressivamente à medida que a pessoa se vai revelando. No problem, será bom na mesma. O que eu quero dizer é que se a mulher, à partida, percebe que aquele sujeito, está afim, está disponível, mas há ali qualquer coisa que não lhe agrada,
por exemplo, porque é um pintarolas que não é confiável (e quando digo confiável não me refiro apenas à questão da fidelidade – refiro-me à confiança em sentido abrangente, factor que é essencial numa relação)
ou, então, se acha que é um choninhas, um totó que não dá uma para a caixa, que não desenvolve (e aqui outra vez em sentido abrangente), então não vale a pena entrar nessa, não vale a pena gastar tempo numa coisa que não vai nunca ser satisfatória e que, com todas as probabilidades, acabará por ser uma decepção .
Ou seja, segundo conselho: Tem que haver um clique, uma química, uma empatia, um entendimento sem reservas para valer a pena entrar numa relação. Caso contrário, é passar à frente e esperar que a sorte proporcione uma nova oportunidade.
. III .
Suponhamos, então, que as duas primeiras condições estão satisfeitas e que existe um relacionamento amoroso.
Em algum momento, mas isso de certeza absoluta, vai acontecer uma chatice, um desentendimento, um desagrado. É normal. Por isso, quando acontecer, não vale a pena dramatizar, não vale a pena vitimizar-se, não vale a pena abrir o baú das memórias e desfiar lembranças amargas, achar que se está outra vez perante mais um exemplar da espécie proscrita dos homens sacanas, mal formados, egoístas, estúpidos.
Nada disso. Não é caso para dramas. Se há chatice, então ela deve ser enfrentada de frente, de peito feito, de igual para igual, exigência e cedência em doses certas, fúria e lágrimas, gritos e ameaças, sim senhora, nada de guardar mágoas, tudo cá para fora, mas sabendo que, no fundo, não é caso de caixão à cova, sabendo que é assim que as arestas se vão limando e que para que duas peças se encaixem, muita matéria há mutuamente a desbastar.
E, por isso, após a explosão de raivas e desgostos, é tempo de, com generosidade e segurança, voltar aos tempos de bonança, ou seja, crise contornada, é tempo de novo dia, pondo para trás das costas o que já é passado - e seguir em frente.
Ou seja, terceiro conselho: uma relação é um investimento que requer manutenção e em que os stakeholders devem entrar com partes iguais, e com corpo e alma. Tem que haver uma verdadeira parceria a todos os níveis e as atitudes devem tender para a convergência. E para a frente é que é caminho.
. IV .
É natural uma pessoa, mesmo tendo um parceiro permanente, por vezes prestar alguma atenção a outros seres interessantes que apareçam no ‘pedaço’. Isso é válido para homens e para mulheres. Pode acontecer uma atracção, um acelerar de pulsações. Nada de dramático. Geralmente não passará disso - não vale a pena o outro ligar todos os alarmes, partir para a vigilância apertada, soltar os ciúmes desenfreados, tornar-se controlador, impertinente. Isso apenas criará, no outro, naquele que pode estar a atravessar uma fase de maior vulnerabilidade, a necessidade de agir pela calada, estimulará cumplicidades, aguçará o engenho e o desejo.
Por isso, quarto conselho: Relax, be cool. A auto-segurança, a auto-confiança, a auto-estima são os melhores antídotos para situações geralmente maçadoras. São, além disso, atitudes bastante afrodisíacas.
. V .
Bem mais precioso que o amor é a vida. Ou seja, lembremo-nos sempe que a vida vem em primeiro lugar.
O amor é não mais que um condimento para a vida. E, como todos os condimentos, deve ser usado com parcimónia, com sabedoria.
O amor não deve nunca estragar a vida. Relacionamentos que tragam sistematicamente tristeza, desconfiança, agonia para a vida devem ser postos de lado.
A vida é única, é uma passagem, uma efémera passagem e deve ser tratada com o cuidado que se dedica aos bens raros, preciosos.
Querer enriquecê-la com o amor é natural e desejável.
Sacrificá-la ao amor é absurdo, indesculpável. Até porque amor a sério é uma coisa boa. Se não é boa, não é amor, é outra coisa, é karma, é uma coisa que não interessa.
Finalmente (finalmente porque o texto já está enorme - se não fosse por isso, poderia continuar até ao 100º) o quinto conselho: Se vive um relacionamento que a traz infeliz, inquieta, ansiosa, sozinha, incompleta, decepcionada, preocupada, etc, acabe com ele; ou se, ao contrário, tem um relacionamento que faz o outro andar sempre assim, acabe com ele (com o relacionamento, claro). A vida a dois só tem sentido se for melhor que a vida a solo.
. VI .
(brinde)
Se vive sozinha e ansiosa por descobrir a sua cara-metade, pare de se lastimar e vá à luta. Os príncipes perfeitos não costumam cair no colo das suas bem amadas.
Sexto conselho: Vá à luta mas não de forma apressada, impaciente, nervosa. Não, é exactamente o contrário: vá com a tranquilidade de quem sabe que quem que tiver que ser, aparecerá e, se as coisas forem bem feitas, até virá comer à sua mão. Saia de casa, saia de dentro de si, vá passear, vá aprender a ser feliz. Arranje-se, sinta-se bem com a sua imagem, vá para sítios onde costuma andar gente tranquila e feliz. Respire fundo, descontraia-se, vá sem medo. Isso transparecerá no seu rosto e torná-la-á uma companhia desejável.
Boa sorte!
NB 1: Tudo isto se aplica, por igual, aos homens. Apenas por facilidade de escrita me dirigi às mulheres.
NB 2: O que escrevi é a minha sincera opinião. Quem achar que não tenho razão, fale agora ou cale-se para sempre ou seja: diga de sua justiça que eu me encarregarei de divulgar.
NB 3: Todas as pinturas são de Paula Rego, pintora e mulher por quem nutro imensa admiração e de quem já aqui várias vezes falei. Grandes mulheres as da obra de Paula Rego, grande mulher a Paula Rego.
PS: Já agora, se são gente valente que leu este tratado até ao fim, não querem descer um bocadinho mais? A seguir ao Closer, lanço um desafio à autora do Histórias de nós. Não querem fazer o mesmo? Ora deslizem lá, se fazem o favor, para verem de que se trata.
PS: Já agora, se são gente valente que leu este tratado até ao fim, não querem descer um bocadinho mais? A seguir ao Closer, lanço um desafio à autora do Histórias de nós. Não querem fazer o mesmo? Ora deslizem lá, se fazem o favor, para verem de que se trata.
Aber! Wo bist du?!
ResponderEliminarVou digerir este manual de superior comportamento (além da pintura da Paula Rego, que sempre me causou, digamos, impressão), e 'já conversamos' (amanhã; ou depois).
A menina tem uma bolinha de cristal, tem?
Ai!...
;)
Eu agora vou concentrar-me na minha bola de cristal a ver se descortino uns númerozitos porque esta semana o euromilhões vale a pena. Até estou capaz de acender uma velinha para iluminar melhor a bolinha, que 80 milhões já é obra!
ResponderEliminarAté amanhã, Margarida.
Adorei! Os seus conselhos são uma luz neste caminho "pedregulhoso", uma possibilidade de liteira! Brinco, mas a verdade é que gostei mesmo muito, e ainda mais com a inspiração de Paula Rego e das suas mulheres soberbas.
ResponderEliminarNão deixo de admirar a sua energia e clareza de ideias! A leitura deste seu blogue é mesmo um arejar do espírito.
Até às próximas leituras!
Olá, Florescente Leitora,
ResponderEliminarMuito obrigada pelas suas palavras. Gostava mesmo que as minhas palavras fossem úteis.
Gosto de partilhar tudo o que sei e gosto de pensar que contribuo para melhorar a vida das pessoas.
Acredito mesmo que a vida pode ser fácil e boa e, para que isso aconteça, acredito mesmo que devemos facilitar, descomplicar, ir em frente, aproveitar o que há de bom, pôr para trás das costas o que não interessa.
E acredito mesmo que, quando a pessoa está disposta e 'na boa' as oportunidades aparecem e, tendo lucidez e alguma sabedoria de vida, saber-se-á perceber se vale ou não a pena e, valendo, a coisa vingará.
Eu, como tenho esta preocupação de aproveitar cada bocadinho de vida, acho um desperdício as pessoas ficarem na fossa, a pensar no que correu mal e reticentes em relação ao futuro.
A propósito de tudo, estou sempre a dizer que'para a frente é que é caminho'.
Be happy, Leitora.
Adorei estas palavras sábias e tão cheias de "garra", de confiança. E as pinturas de Paula Rego, tão bem escolhidas, tornam este documento, de consulta obrigatória, ainda mais completo e apelativo.
ResponderEliminarObrigada, leonor, pela visita e pelas suas palavras.
ResponderEliminarFico mesmo contente que sinta que as minhas palavras são de alguma utilidade. Foram escritas com todo o carinho, mesmo com a intenção de poder, de alguma forma, ajudar a recuperar a auto-confiança e a auto-estima a quem sofreu desaires e ficou magoado, inseguro.
Fico também muito contente que tenha apreciado as pinturas de Paula Rego, uma mulher forte, que cria personagens femininas com fortíssimo carácter e que nos transmitem diferentes emoções.
Volte sempre, Leonor.
(Como sabe, aprecio muito a sua forma de escrever. O seu blogue tornou-se um local de peregrinação diária - e, quando não há textos novos, passeio pelos antigos)