terça-feira, abril 19, 2011

Freitas do Amaral, Teixeira dos Santos, Luís Amado, Ana Gomes e, claro, Manuel Maria Carrilho e Henrique Neto - e Churchill e José Sócrates


O cansaço do gladiador

À noite, ao recolher-se, José Sócrates pensará com tristeza como são injustos aqueles que ele tinha como amigos. Pensará com amargura nos ataques soezes que enfrentou, nas deslealdades que o feriram, nas lutas que travou sem dormir, sem descansar, pensará nos dias em que se levantou de madrugada para estar a seguir num local, depois, sem almoçar no carro a estudar os dossiers, depois reuniões, aviões, cimeiras, e sempre a puxar pela carruagem, pelo governo, pelo partido, pelo país.

Nessa luta que travou como um animal feroz não viu contudo que a conjuntura ia mudando mais depressa do que ele a percebia, não viu que o monstro em que o estado social se transformou devorava as reservas financeiras, não viu que as agências de rating eram mais ávidas que a sua capacidade de resistir, não viu que o precipício se cavava cada vez mais fundo sob os seus pés. Nessa luta incansável não ouviu os avisos dos técnicos, deixou que - injustamente - a mancha da incompetência alastrasse sobre Teixeira dos Santos, não ouviu os avisos dos amigos que lhe traziam alertas do estrangeiro e ignorou os conselhos de Luís Amado, cansou-se com as censuras de Ana Gomes. E agora esses que tanto o avisaram e a quem ele não ouviu, agora que ele tanto precisava de apoio, manifestam-se em público.

As reflexões sensatas do Senador: Sócrates chamou tarde demais o FMI

Com serenidade, Freitas do Amaral referiu na RTP, falando com Fátima Campos Ferreira, que o excesso de voluntarismo de José Sócrates lhe toldou a visão e o discernimento, refere, com uma amizade triste e madura, o óbvio: o voluntarismo levado ao limite deixou o País à beira da rutura.

Churchill perdeu as eleições depois de ter ganho a Guerra.

São injustas e têm memória curta e cruel, as pessoas.

Mas infelizmente, Sócrates não tem, nem terá a dimensão histórica de Churchill e a comparação serve apenas para demonstrar por excesso o que quero dizer.

É que, por muito que me custe admitir (porque não quero que se pense que acho que há, de momento, alternativas melhores nos outros partidos), depois de uma primeira metade da primeira governação corajosa e bem sucedida, Sócrates veio perdendo o pé (foi a crise, foi a proximidade de eleições, foi a crise, foi a governação em minoria - não foi fácil, temos que reconhecer) e esta última fase foi penosa.

Este congresso de Matosinhos foi uma ficção, foi uma alienação, uma encenação patética.

Passado o pico emocional, as pessoas começarão a cair na real. Este afastamento público de personalidades como Diogo Freitas do Amaral, Teixeira dos Santos ou Luís Amado, a que estamos a assistir, traduz esse esfriar de ânimos. O período que se segue trará a racionalidade e, certamente, as críticas começarão a surgir de onde menos Sócrates gostaria que viessem.

Admiro a resistência de Sócrates, a sua inacreditável força anímica. Mas, como já aqui referi várias vezes, considero que não tem perfil nem condições para o período que se segue.

Para bem do PS e, sobretudo, para bem do País, deverá descansar, deverá dar a vez ao senhor que se segue.


Provavelmente os experientes Senhores da Política (Mário Soares, Jaime Gama, quiçá a máquina maçon) começarão agora, com discrição, a tentar encontrar a melhor forma de o fazer compreender isso, sem que ele se sinta excessivamente magoado.

2 comentários:

  1. Freitas? Um especialista em morder a mão...

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  2. De facto tem alguns antecedentes nessa matéria. Contudo, tem também uma carreira meritória e tem, à medida que a idade avança, alguma lucidez 'from the balcony', que lhe permite analisar com distanciamento e dizer sem rodriguinhos aquilo que pensa. Não o vejo como um guru, longe, muito longe disso, mas é uma voz que deve ser ouvida. Tal como Campos e Cunha, tal como Teixeira dos Santos, tal como Mário Soares.

    Eu, da minha parte vou formando a minha opinião a partir do que penso mas também gosto de ir aferindo a partir das ideias dos outros, pois diferentes perspectivas ajudam-nos a ter ideias mais consistentes.

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