Seria natural que falasse hoje do discurso de tomada de posse de Cavaco Silva mas não consigo.
A sua hipocrisia política vai para além do que consigo processar. Ao ouvi-lo apelar ao sobressalto cívico, quem não saiba, não supõe que estamos perante o responsável pela governação do País durante vários anos e Presidente da República nos últimos cinco.
A ideia que dá é que, com o espírito vingativo cuja fama chegou até aos EUA, não descansará enquanto não der cabo de Sócrates nem que, para isso, tenha que incendiar o País.
Pode ter razão em muito do que diz - e tem - mas é estranho ver um presidente a assobiar para o lado, a fazer de conta que se esqueceu de que muito do que acontece agora decorre de decisões suas enquanto governante, enquanto figura de topo da hierarquia de Estado.
O discurso revela algo de feio e de preocupante para Portugal.
Tanto que até me aborrece falar disto.
Vou antes falar outra vez dos jovens a quem Cavaco Silva, com a sua costela avoila, também se colou, instigando-os à luta. Claro que, dada a tenra idade, estes jovens não têm memória dos tempos em que Cavaco foi 1º ministro, traçando muito do rumo político que hoje se trilha. E até já li que alguns destes jovens ficaram sensibilizados com o apoio de Cavaco.
De uma mediocridade tenebrosa, isto.
Vou, portanto, falar de novo sobre os jovens da Geração à Rasca (como eu abomino esta expressão...)
Não há nada mais útil a uma causa do que heróis vitimizados. A turba une-se naturalmente em sua volta para os vingar, para os honrar. Se antes a causa era difusa, a partir de aí ganha rostos. Seja o professor que fura um cordão policial e é empurrado, imediatamente se transformando num novo Che Guevara, seja agora o grupinho de penetras que, de cartaz em punho, invade um recinto em que vai decorrer um encontro partidário, tendo sido empurrado de lá para fora (já que, por convite, não saíam) transformando-se, de imediato, em heróis.
João, Paula e Alexandre, três dos organizadores da manifestação de 12 de março
Com este episódio banal que nem digno de registo seria, os iletrados da política agora histericamente já clamam: ‘fascismo!’ ou ‘é o fim da democracia!’.
Felizmente para eles e para todos nós, estão enganados. Regimes não democráticos ou fascistas são coisas muito diferentes do regime em que vivemos.
Heróis? Vítimas de um regime não democrático? Claro que não.
O que se passa é que a algumas pessoas corre nas veias o gosto pela luta (seja ela qual for). Cheira-lhes a confusão e aí vão eles.
Independentemente do sexo ou condição social, há os góticos, há os rappers, há os intelectuais, os metrossexuais, os ecológicos, os tecnológicos, os gestores, os desportistas, os balofos, os meninos da mamã, os escuteiros, etc e tal, e mais os carneiros, os surfistas e os amigos da luta, ou lato sensu, homens da luta (agora parodiados pelos manos Jel e Falâncio).
Os Homens da Luta - Nuno,Vasco Duarte & Amigos - sempre prontos para um bom caldinho
Com as devidas adaptações cronológicas, sempre assim foi desde o princípio dos tempos.
Geralmente os carneiros e os surfistas acompanham os homens da luta. Estes últimos provocam, desafiam, andam à cacetada, e atrás, a bramar, a balir, vai a carneirada e, por cima, aproveitando a onda, seguem os surfistas. Nada de novo, aqui e em todo o lado, com as devidas adaptações culturais.
Por vezes os amigos da luta interpretam bem o sentir de um povo e, justamente, desencadeiam movimentos válidos, libertadores. São os que ficam para a história porque mudam o seu rumo.
Mas nem sempre há causas históricas e os homens da luta não podem esperar, o gostinho pela confusão está-lhes na massa do sangue. Então tudo serve.
É o caso dos auto-proclamados parvos ou enrascados deolindos.
Ouvimos o que dizem e que nos fica é que parece que não estão preparados para esta vida que não é fácil, que querem bolsa ou subsídio que dê para o carro e para o estacionamento que está tão caro, para o clube ferroviário e para o lx factory, para a Zambujeira e o Rock in Lisbon, para o iPad e PS2, para as bejecas, shots e circuito das tasquinhas.
E logo se lhes juntam as avoilas e os picanços, a menina Rato, os BEzinhos enfáticos e empinocados (ainda agora vi a Joana Amaral Dias, hirta e convencida, armada em sexy, dissertando do alto da sua cátedra revolucionária), os juízes e quejandos, promoção na carreira e casa à borla.
E vai daí arranjam uma arruaçazeca onde consigam levar um empurrão (ou mesmo um estaladão – que isso, sim, seria a coroa de glória) certos de que logo aparecerão os abutres da comunicação social a dar-lhes tempo de antena para que possam gritar ‘Fascismo!’ e que, acto contínuo, aparecerão os arautos de megafone em punho a conduzir a carneirada, sempre pronta para fazer grupo, mais os surfistas do costume a compor o ramalhete.
É ver o PCP inquieto a colar-se de qualquer maneira (porque a rua, com os diabos!, a rua é dos comunistas), é o Bloco de Esquerda todo nervoso (a manif é minha! a manif é minha!!!), é o PSD (têm razão, têm razão e já agora ajudem a derrubar o governo que nós estamos com a goela aberta à espera de ir matar a sede ao pote - PPC dixit), é agora esta adesão de luxo, o próprio Cavaco Silva.
Um albergue espanhol: uns a dizerem banalidades, outros de megafone em punho, outros a cavalgar a onda.
A falta de ideias (e até o mau domínio da língua portuguesa) não auguram nada de bom
Esclarecimento: não quero com isto dizer que acho que os tempos estejam fáceis. Acho o contrário.
Lamento que os jovens não consigam trabalhos dignos, que a economia esteja uma lástima. Lamento que o futuro, para muitos jovens, seja uma miragem. Lamento que tanta gente de meia idade vá para o desemprego. Lamento que a vida esteja tão difícil. Lamento que os juros estejam a subir para níveis insustentáveis. Lamento quue o País esteja falido.
Mas a primeira coisa a fazer para sairmos deste marasmo (que por analogia é como as águas de Redondo Beach, L.A. Califórnia, que estão pejadas de milhões de sardinhas mortas, um caldo pesado, anaeróbico, onde qualquer forma de vida parece impossível) é afastarmos a maltosa desqualificada que tem invadido os partidos e que, a partir daí, ocupa o lugar de legisladores e governantes.
Em Los Angeles, águas carregadas de sardinhas mortas, milhões de sardinhas mortas, águas sem oxigénio
De forma geral, grande parte da classe política actual quase parece a tropa fandanga da Quinta dos Animais – ou o Triunfo dos Porcos – de George Orwell (cuja leitura muito vivamente recomendo).
"Todos os animais são iguais mas alguns são mais iguais"
Parecem homens, portam-se como homens, andam de fato e em cima de apenas duas patas mas olhemo-los bem… Que conhecimentos, que cultura, que experiência de vida, que desprendimento, que arcaboiço, que visão estratégica lhes vemos para que os possamos considerar dignos dos lugares que ocupam?
O mundo está em convulsão e tudo aquilo em que assentou nos últimos anos vem sucessivamente a colapsar. A alavancagem financeira, o crédito fácil e barato, a alimentação abundante e a baixo preço, o petróleo a la volonté, uns países com elevados recursos mas uma população miserável para onde escoar excedentes e com uma liquidez muito conveniente, e por aí fora… tudo a ruir. Em contrapartida a Ásia paulatinamente vai conquistando poder. Uma economia em crescimento consistente e continuado, com excedentes de liquidez, que vem comprando a dívida de tudo o que é mundo ocidental. Grande parte da economia americana e europeia está nas mãos dos países do oriente, em especial da China. O impacto geopolítico deste facto ainda está por se manifestar mas será, certamente, um outro sobressalto.
Seria preciso que, do lado de cá, surgisse uma nova geração política com capacidade de reinventar uma ambiciosa visão de futuro. E era nesse sentido que a juventude descontente deveria concentrar esforços em vez de andarem domesticamente a varrer o chão do insignificante lixo orgânico da politicazinha nacional.
Dá-lhes Falâncio! quer dizer, Dá-lhes M!
ResponderEliminarCom esse discurso todo ir à manif no dia 12 é um must
Viva a Luta! A Luta é Alegria!